Jogos no Brasil alternam tradição e modernidade

Como as apostas esportivas e jogos de azar se adaptaram à era digital e conquistaram um novo público no Brasil e estão mudando o jogo.
por
Maria Luiza Abreu
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12/11/2024 - 12h

Por Maria Luiza Abreu

 

Em um País onde o futebol é símbolo de uma cultura vibrante e apaixonada, as apostas e os jogos de azar sempre tiveram seu lugar no cotidiano dos brasileiros. Assim como o esporte, essas práticas têm raízes profundas na sociedade. No entanto, o hábito de acompanhar campeonatos era, em grande parte, uma prática empírica e informal. Hoje, isso está se transformando, e muito disso se deve à chegada das plataformas digitais, conhecidas como bets. As “bets” são apostas feitas em eventos cujo resultado é incerto, como partidas esportivas ou jogos de cassino. No Brasil, as apostas online foram regulamentadas em 2018 e se tornaram bastante populares, especialmente as apostas esportivas. A prática é legal, desde que realizada em plataformas regulamentadas e seguindo as normas estabelecidas pela Lei nº 14.790/2023. Isso inclui o uso de meios de pagamento formais e a operação de empresas devidamente licenciadas.

Gustavo, de 21 anos, é um dos muitos brasileiros que se depararam com a oportunidade de transformar uma paixão em uma fonte de renda extra. Torcedor do Corinthians desde criança, sempre gostou de acompanhar o futebol brasileiro e alguns campeonatos internacionais. Ele começou a apostar de forma simples, ao perceber que quase todos os seus amigos também o faziam. Através das plataformas de apostas online, viu a chance de complementar sua renda. Conta que suas primeiras apostas foram por pura curiosidade, durante a pandemia, época em que esse setor ganhou espaço e teve um crescimento explosivo. Por meio de um anúncio, ele encontrou a primeira plataforma em que apostou, que, além das redes sociais, era divulgada no intervalo dos jogos e até nas camisetas dos clubes de futebol e estádios. Após pesquisar e assistir a alguns vídeos explicativos, Gustavo foi aprendendo mais com a prática. Para ele, as apostas online chegaram ao mundo dos esportes de maneira natural, parecendo algo comum e fazendo parte da rotina. Quem já assistia ou era fã de algum time ou esporte foi, de certa forma, induzido a apostar. A chegada das bets online não só ampliou o mercado das apostas, mas também trouxe uma nova dinâmica ao modo de como se relacionar com o esporte.

As apostas de Gustavo não se limitam às apostas esportivas; ele também já experimentou outros jogos. Um deles, onde obteve mais lucro, é o "Fortune Tiger", popularmente conhecido como "jogo do tigrinho". Esse jogo de cassino online ganhou notoriedade no Brasil, especialmente pela divulgação excessiva nas redes sociais. O objetivo é combinar três figuras iguais nas três fileiras que aparecem na tela. Apesar de prometer ganhos fabulosos, o jogo é considerado ilegal no Brasil por se enquadrar na categoria de jogos de azar, onde o ganho ou a perda dependem exclusivamente da sorte. De acordo com a Lei de Contravenções Penais (Decreto-Lei nº 3.688/1941), mesma lei que proíbe o antigo e tradicional "jogo do bicho", presente no cenário dos jogos de azar no Brasil desde o final do século XIX, esses tipos de jogos de azar são proibidos no País. Eles têm sido alvo de investigações devido a relatos de perdas financeiras significativas e práticas enganosas promovidas por influenciadores digitais. Assim como o  jogo do bicho, que, apesar de enraizado na cultura nacional, é historicamente associado a atividades criminosas, o "jogo do tigrinho" prejudicou financeiramente inúmeros jogadores.

A transformação digital permitiu que as apostas fossem realizadas em casa, tornando a prática mais conveniente e transformando em hábito o que antes era restrito a locais físicos, como cassinos e bingos, ou no caso do jogo do bicho, a bancas de jornal, bares e outros comércios. Além disso, a modernização permite o acompanhamento em tempo real dos resultados e das estatísticas das apostas, o que adiciona uma nova dimensão à experiência do jogador. Agora, é possível se aprofundar, estudar e tomar decisões mais estratégicas com as informações disponíveis — como fez Gustavo, que antes de começar a jogar, buscou aprender com produtores de conteúdo especializados nesse tipo de prática.

O critério usado por Gustavo para realizar suas apostas online é mais intuitivo do que estratégico. Ele sente que as apostas esportivas são mais "reais" e oferecem mais segurança por se tratarem de algo concreto. Nunca fez apostas com valores altos e confessa se preocupar com a proporção que as apostas estão tomando, já que se tornam cada vez mais recorrentes. Gustavo observa que isso impacta diretamente na educação financeira e na saúde mental de seus colegas, que não têm a mesma consciência de gastar apenas o dinheiro que sobra. Como resultado, acabam perdendo mais do que lucrando, e a tentativa de recuperar o dinheiro perdido se transforma em um looping, ciclo vicioso que pode levar, inclusive, ao desenvolvimento de uma dependência difícil de controlar.

O surgimento das apostas online faz parte de uma evolução natural do comportamento do brasileiro. Em 2012, o IBGE publicou um levantamento apontando o jogo do bicho como responsável por 14% dos gastos dos brasileiros com apostas. Em 2024, o Banco Central divulgou uma pesquisa revelando que cerca de 20 bilhões de reais foram gastos por mês em apostas online nos primeiros oito meses de 2024. Durante o período analisado, cerca de 24 milhões de pessoas participaram de jogos de azar e apostas online, realizando pelo menos uma transferência via Pix. Apesar de não ser considerado ilegal apostar em plataformas regulamentadas que seguem os critérios exigidos pela legislação, o impacto das apostas online no Brasil ainda é perigoso. Embora possam proporcionar uma nova forma de lazer, também podem gerar dependência, principalmente entre os mais jovens que optam por rejeitar a tradição e abraçar a modernidade.

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