Internação involuntária e o mundo das drogas

A jornada do abuso de substâncias até a dependência química e o tratamento de reabilitação voluntário
por
Bruna Quirino Alves
Maria Eduarda Camargo
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28/10/2022 - 12h

 

Ela vinha em pequenos frascos, de metal ou vidro, com imagens ilustrativas e crianças sorridentes — comercializada para fins anestésicos e tratamento do vício em morfina ou álcool. Assim nasceu a cocaína, droga originada das folhas da coca e que teve — há mais de 100 anos  — seus anos dourados de legalidade. Mas a realidade do vício é muito diferente do glamour dos ternos dos empresários e das festas dos fins de semana.

De acordo com o novo Relatório Mundial sobre Drogas divulgado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) em 2021, cerca de 5,5% da população entre 15 e 64 anos usou drogas pelo menos uma vez em 2020, enquanto 36,3 milhões de pessoas, ou 13% do número total de pessoas que usam drogas, sofrem de transtornos associados ao uso de drogas. A psicóloga Lúcia Silva explica que: "A dependência química não se trata de uma vontade de consumir determinada substância e sim da incapacidade de não consumi-la".

No Brasil, segundo pesquisas da OMS, cerca que 6% da população brasileira atual possui dependência química, totalizando 12,4 milhões de pessoas. Os hospitais credenciados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) tiveram um aumento de 54% em 2020 no atendimento de dependentes químicos em relação a 2019, de acordo com os dados do Ministério da Saúde.  

A lei de n°13840 — sancionada pelo atual presidente Jair Bolsonaro no ano de 2019 — prevê a alteração da lei n°11343, possibilitando a internação involuntária de pacientes com dependência química. A internação involuntária ou compulsória é toda aquela que ocorre sem o consentimento do paciente. Para que ocorra, é necessário um pedido de internação vindo do médico psiquiatra — mesmo sem o consentimento ou pedido de internação da família.

Em entrevista à Revista Veja, o ator global Fábio Assunção conta as dificuldades que enfrentou na sua luta contra a dependência química e os danos gerados pela exposição sofrida por ele durante o seu processo de reabilitação. 

"Fui pela primeira vez aos Alcoólicos Anônimos há cerca de quinze anos. Na saída fui fotografado por um paparazzo e saiu uma nota no jornal. Aquilo me prejudicou muito e demorei anos para voltar.’’ 

Fábio faz parte da nova série da Globoplay ‘’Onde está meu coração’’ na qual ele interpreta o pai de uma jovem médica que se torna usuária de crack, a série retrata como o vício atravessa uma família e os conflitos que são gerados a partir disso, escrita por George Moura e Sergio Goldenberg, com direção artística de Luísa Lima.  

No painel realizado pela Globoplay na Comic-Con Experience (CCXP), o ator ressalta como fazer parte da produção foi importante na sua jornada com a dependência química. "Pra mim, tudo foi emocionante. Cada coisa que eu falava pra minha filha [na série] por causa da dependência, é como se eu estivesse me ouvindo também. É uma série em que eu estava presente de todas as formas, como ator, como pessoa.’’

Lúcia ainda comenta que: "O ideal é que a intervenção terapêutica combinada seja feita em instituições especializadas e que disponibilizem uma equipe multidisciplinar composta por médicos clínicos, psiquiatras, psicólogos, assistentes sociais e outros. Além do uso de remédios, o trabalho de aconselhamento auxilia na importância de evitar comportamentos que colocam a saúde em risco. Por meio de uma intervenção multiprofissional é possível alcançar resultados mais satisfatórios na reabilitação do paciente. Quando se trabalha em equipe, o compartilhamento de ideias ajuda a perceber, com mais clareza, a necessidade de eventuais ajustes para tornar as terapias ainda mais eficientes". 

Existe uma importância significativa no tratamento combinado e que é ainda mais alavancado pelo apoio individual e familiar. Assim, o paciente é incluído no próprio tratamento e pode, ativamente, contribuir com sua melhora. E a internação voluntária é a chave para que haja a colaboração e a humanização do paciente e para que o tratamento possa evoluir positivamente.

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