Por Rafaela Correa de Freitas
Desde a invenção dos Ebooks, o mercado de livros voltou a estagnar e não viu mais seus dias de glória como quando os leitores bombaram com a ideia dos livros digitais. A chegada da pandemia intensificou a crise que já estava ocorrendo no setor, com a sua quase monopolização pela empresa Amazon vendendo livros físicos por menos da metade do preço e tornando seu E-reader o mais procurado do mercado, junto com a crise das MegaStores que fez com que grandes nomes falissem e fechassem suas livrarias no Brasil inteiro, culminou em mais um período turbulento para o setor.
Contudo, 2021 chegou, e apesar do vírus ainda estar circulando, o mercado por fim conseguiu respirar. O que houve foi que com as pessoas em casa, todos passaram a procurar na Internet o que poderiam fazer, e a resposta estava não só nos serviços de streaming ou jogos, mas também nas redes sociais que se tornaram verdadeiras aliadas quando, por exemplo, pessoas comuns passaram a divulgar sua rotina de leituras junto com os seus títulos favoritos e até mesmo memes. O TikTok foi uma delas, o próprio aplicativo bombou durante a pandemia mas os leitores criaram uma # dentro do app, formando uma comunidade efetivamente deles e criando verdadeiros influenciadores que levaram livros viralizados na plataforma ao topo de vendas e listas do The New York Times Best Sellers.
Um exemplo disso foi o livro “Mentirosos” da autora E. Lockhart que viralizou na plataforma e hoje não sai da lista de mais vendidos ou da seção de destaques de livrarias no mundo inteiro. A página em inglês do livro na Amazon até mesmo ganhou um novo título: “We Were Liars: The award-winning YA book TikTok can’t stop talking about!” (Mentirosos: O premiado livro jovem-adulto que o TikTok não consegue parar de falar!)
Afinal, quem são essas pessoas que estão por trás do sucesso de tantos livros e a alta de 48,5% da venda de livros no primeiro semestre de 2021? A resposta é que eles sempre estiveram ali, começaram nos blogs e se tornaram mais famosos no Youtube, conhecidos como Booktubers, mas também estiveram no Instagram (sim, os bookstagramers) e agora, com o Booktok e a Twitch (aplicativo e site para fazer vídeos ao-vivo) eles finalmente começaram a conquistar mais reconhecimento, trazendo benefícios não só para o mercado mas também para os leitores. Sejam as lives de “sprint” onde o influenciador lê algo ao vivo com seus seguidores incentivando um “clube do livro à distância” ou com as já conhecidas “resenhas” onde as pessoas dão uma nota junto com sua opinião sobre o livro, eles conquistaram espaço e criaram uma comunidade que se incentiva e apoia, trazendo temas importantes à tona como os gatilhos emocionais, classificação indicativa, problemáticas e representatividade nos livros.
Gabriela Rangel, dona do perfil artt.books no Instagram conta que teve a ideia no intuito de encontrar mais pessoas que compartilhassem do gosto pela leitura, mas encontrou muito mais: “Foi um espaço pensado para me dar liberdade de conversar com pessoas que gostavam das mesmas coisas. Acredito que quem me inspirou e me deu todo apoio do mundo foi meu pai, fico muito grata por ter ele ao meu lado!”, o perfil cresceu rápido, nasceu depois de um mês da criação de seu blog que conta com o mesmo nome, e hoje Gabriela se encontra na Twitch, onde faz lives, Youtube e Instagram.
As comunidades de leitores formaram laços e conquistaram a atenção para um mercado há muito esquecido, mas como todas as outras, também trouxe discussões acaloradas sobre o que consideram melhor ou pior, criando até mesmo tribos dentro das redes com os que preferem gênero x acima do y e que entram em conflito constantemente. Com sua influência, tornou-se papel desses creators também servir como mediadores em discussões e até mesmo fazerem parte da construção de um coletivo mais saudável: “Acredito que o influenciador é importante para suprir a falta de investimento do Brasil no meio literário. Podemos observar o grande crescimento das páginas literárias no tiktok e sua grande influência no aumento da compra de livros. Além disso, acho importante o espaço deles nas redes sociais mostrando que existem outros gêneros literários e que precisamos respeitar a diferença de gostos em relação aos livros, opiniões e gostos sempre podem divergir e está tudo bem!” conta Gabriela.
Ela nos mostra um lado incomum disso tudo: não como o influenciador mudou a vida dos leitores, mas como a comunidade e seus perfis mudaram a dele: “Acredito que minha página abriu portas que eu nunca poderia ter imaginado. Comecei a me envolver bastante com redes sociais (algo que nunca gostei muito), criei laços maravilhosos com pessoas incríveis e, além disso, consegui me inserir bastante no meio editorial, hoje tenho parceria com 6 editoras fixas. Em mais de dois anos de trabalho, percebi muitas mudanças como: o profissionalismo, a melhora no conteúdo, a forma de demonstrar minhas opiniões e minha relação com o público. Acabei amadurecendo ao vivenciar as dificuldades de trabalhar nas mídias.” E com isso, a creator também cita o lado ruim de trabalhar com as redes sociais.
“Saber lidar com o público é um dos maiores desafios sempre, temos que ter muito cuidado com o que falamos na internet, principalmente nas bookredes. Acredito que a internet traz uma confiança que não temos na vida real, então é muito fácil ser machucado por comentários maldosos. Além disso, ter uma constância de conteúdo é bem difícil, sempre podemos enfrentar um bloqueio criativo”
Apesar de seus altos e baixos, essas comunidades foram em grande parte responsáveis pelos mais de 28 milhões de livros vendidos no início de 2021, onde a cultura se provou resistir mesmo em seus tempos mais tenebrosos.