Impactos da pandemia na vida das empregadas domésticas

Um dos grupos mais atingidos pela crise econômica da pandemia, é lembrado no dia 27 de abril.
por
Ana Beatriz Assis
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26/04/2022 - 12h

Rosana Urbano, 57 anos, foi a primeira vítima fatal de covid-19 no Brasil, no dia 12 de março de 2020. Junto dela, a mãe e os dois irmãos morreram dias depois. Rosana era empregada doméstica. O caso retrata uma sombria dinâmica da sociedade brasileira: como certos grupos são os primeiros a sentirem os impactos de uma crise. As domésticas são um deles.  

Segundo o IBGE cerca de 1,2 milhões de pessoas perderam os empregos na atividade doméstica entre setembro e novembro de 2020. Malba Erlândia (45) faz parte das estatísticas: “Fui dispensada por pegar transporte público. E daí, poder levar o vírus pra casa deles.” A doméstica ainda se encontra desempregada. “As trabalhadoras domésticas foram as que mais tiveram esse impacto decorrente dos efeitos que a crise trouxe, do ponto de vista da segurança das famílias, impedindo muitas vezes que elas pudessem exercer sua atividade por opção delas e por opção das famílias para as quais trabalhavam”. Diz sociólogo e atual assessor das Centrais Sindicais, Clemente Ganz Lúcio em entrevista para fundação 1° de maio.   

A pandemia gerou diversas incertezas no mundo trabalhista dessas profissionais e seus respectivos patrões, sendo necessário realizar adaptações dos dois lados para continuar as atividades. “A Dailza tirou as férias vencidas e fizemos alguns acordos de suspensão do contrato de trabalho ou redução de jornada [..]” Leila,(não revelou seu sobrenome) advogada, diz que a funcionária trabalha para a família desde 2016. A patroa diz que se esforçou para mantê-la no cargo: “Como sabia que o governo pagaria menos do que ela ganhava, combinei com ela e completei o valor para ela não sentir a falta do valor”. Outro fato que pode ter intensificado a vulnerabilidade das domésticas foi a reforma trabalhista de 2017, que alterou diversos fatores na dinâmica de contratação e demissão. 

Dona Malba Erlândia recebeu sua rescisão salarial após sua demissão, porém, não teve acesso ao seguro-desemprego, já que optou pela rescisão de mútuo acordo. A reforma vinha com o objetivo de diminuir o trabalho informal, adicionando o contrato intermitente ao seu currículo de mudanças, Maiara Carvalho, advogada trabalhista, expressa sua opinião em artigo, sobre o novo nicho criado: “Argumenta-se que a reforma trabalhista, no ponto em que cria a nova figura, apresenta-se incompatível com a Constituição e com a Convenção de nº 95 da OIT porque viola, dentre outros direitos, a garantia do salário mínimo, justo e razoável.” 

A reforma trabalhista, deixou lacunas que a pandemia deixou mais evidente: “Não tenho horário de almoço, meu horário de almoço é a hora que dá”, diz Cândida Pereira Soares (59), trabalhadora doméstica que dá graças a Deus não ter sido demitida durante a pandemia. Em 2017, o horário de descanso passou a ser negociável. “Junto aos contratos encerrados, denúncias sobre abusos cresceram. Muitas mulheres são coagidas a aceitar ficar ou perdem o emprego. É um limite tênue entre o abuso e o trabalho análogo à escravidão", diz Luiza Batista, presidente da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), para o jornal Extra no contexto pandêmico. 

“Tinha uns bendito que queria folgar em cima de mim e não pagar [horas extras], mas quando não recebia, também não ficava mais” alega Malba Erlândia sobre suas experiencias. “Na maioria das vezes o sim é mais valioso que tudo”. Além de enfrentarem o desemprego, muitas domésticas ainda lidam com um mercado saturado e por muitas vezes cheios de propostas abusivas. 

Interface gráfica do usuário, Texto, Aplicativo, chat ou mensagem de texto

Descrição gerada automaticamente 

(Reprodução:CNN) 

 

Outra saída vinda com a pandemia, foi o aumento do uso de aplicativos para contratação de serviços domésticos, porém, em muitos casos, existe uma desconfiança dos dois lados.: “Não me sinto confortável de ter pessoas diferentes circulando em minha casa. Sempre contrato pessoas indicadas e confiro referências”, diz Leila ao ser questionada sobre a possibilidade de contratação via aplicativo. “Nunca ouvi falar e acho meio estranho”, desconfia Cândida.  

Marcela Vigo, assessora de comunicação do Instituto Doméstica Legal, apresenta dados positivos sobre o mercado das empregadas daqui pra frente: “Na última PNAD continua, do trimestre de dezembro/2021, janeiro e fevereiro de 2022, divulgada pelo IBGE, o número de 5.663.000 trabalhadores domésticos, apresentou uma grande recuperação de postos de trabalho em relação ao mesmo trimestre do ano anterior”. Malba Erlândia se vê com más expectativas de emprego neste ano, pois, encontra propostas cada vez mais exigentes. 

Dia 27 de Abril homenageia Santa Zita, que é padroeira da categoria. Ela era conhecida por sua gentileza e amor ao próximo, trabalhava desde seus 12 anos. Este dia não é considerado feriado na grande São Paulo, empregadas domésticas trabalham normalmente, talvez ganhem um abraço ou aperto de mão, e as desempregadas, fazem suas preces para que a Santa as faça voltar logo ao trabalho.