Gran Turismo: a emoção das pistas na tela

Como a franquia japonesa conseguiu tornar um simples jogador em um piloto de verdade
por
Rodrigo Silva Marques
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02/10/2023 - 12h

Considerado uma das franquias mais populares, famosas e bem-sucedidas da história, os jogos da série de videogame Gran Turismo, produzidos pela Polyphony Digital, ganharam o gosto do público mais uma vez, mas desta vez por um motivo diferente. Isso porque no dia 24 de agosto de 2023, estreou nos cinemas um filme baseado numa história real envolvendo o videogame, Gran Turismo: De jogador a corredor. O jogo, exclusivo das plataformas PlayStation, foi concebido para simular a aparência e o desempenho de diversos veículos, quase todos reproduções licenciadas de carros reais. Desde a estreia da série em 1997, já foram vendidas mais de 70 milhões de unidades do game, sendo o mais memorável o terceiro título da franquia, Gran Turismo 3: A-Spec, de 2001, considerado um dos melhores jogos de todos os tempos, além de ter sido o segundo mais vendido da história do Playstation 2. Com tamanho sucesso, a Sony (distribuidora do game) resolveu levar a franquia para o cinema, enfrentando dois grandes obstáculos. O primeiro é o contexto, mesmo com sucessos recentes como Pokémon: Detetive Pikachu e Sonic: The Hedgehog, que agradaram tanto o público (em sua maioria fãs de videogame) quanto a crítica, filmes baseados em jogos possuem um longo histórico de fracassos e desastres no mundo da sétima arte.

O segundo obstáculo é como desenvolver um filme baseado num jogo sem história? Foi aí então que a solução encontrada foi em um evento feito pela própria Gran Turismo. O GT Academy foi um programa de televisão produzido pela Grand Central Entertainment e financiado pela Nissan e Sony Interactive Entertainment de 2008 a 2016. A GT Academy, por exemplo, fornecia a talentosos jogadores de Gran Turismo a oportunidade de conseguir uma carreira profissional de corrida na vida real como piloto de fábrica da Nissan. Em umas das edições do torneio, o vencedor foi o galês Jann Mardenborough, que sonhava em ser piloto profissional desde criança, mas a família não tinha o dinheiro necessário para iniciar a carreira no automobilismo e ele não conhecia ninguém que pudesse patrociná-lo.

Porém, ao vencer a edição de 2011, conseguiu ser o mais jovem e bem sucedido a passar pelo desafio, conquistando o terceiro lugar nas 24h de Le Mans, em 2013. Pronto, eis a história perfeita para um filme. A tecnologia dos jogos chegou ao ponto de permitir que um simples jogador tenha capacidade para pilotar um carro de verdade Apesar disso, existem opiniões divergentes. Alguns profissionais gostam de ter um contato inicial com circuitos, memorizar pontos de freada, etc. Várias equipes de Fórmula 1 têm simuladores, com destaque para os da Mercedes e McLaren. Mas os pilotos também brincam e às vezes aparecem jogando games casuais e disputando ligas online. O multicampeão Michael Schumacher dizia que "a maioria dos pilotos" sofre de cinetose, resultado de uma incompatibilidade entre o movimento que se enxerga e a sensação percebida pelos ouvidos, mais especificamente pelo aparelho vestibular, um grupo de órgãos localizado na área interna do ouvido e responsável pelo equilíbrio corporal, e que a única vantagem era conhecer pistas, o que para ele nunca foi problema.

O campeão de 2007, Kimi Raikkonen, por exemplo, declarou que não gostava de simuladores, nem de videogames, mas quando retornou à Ferrari em 2014, teve que usar o equipamento pois o regulamento restringia testes reais por questão financeira. “Seria muito fácil dizer que só porque você é bom no jogo, vai ser bom na vida real, mas não é tão simples. Precisa ao menos ter um conhecimento e treinamento básico”, diz Thiago Farias, de 20 anos, kartista e entusiasta da franquia. “O filme, a princípio, dá a sensação que seria fácil pegar um carro, correr com ele usando apenas habilidade de videogame, mas quanto mais vai passando o filme, mais vai mostrando que existe um processo por trás, não só sentar e acelerar”, comenta Luís Albuquerque, de 14 anos, fã de carros e espectador da F1.  

Um trunfo importante para quem domina as pistas virtuais é a capacidade de desenvolver trabalhos fora da pista. Em uma das cenas do filme, Jack Salter (David Harbour), chefe da equipe Nissan, onde Jann (Archie Madekwe) corre, é surpreendido por uma forma de ultrapassagem desenvolvida pelo jovem através do que aprendeu jogando. Podemos pensar em aceitá-los como um primeiro passo, uma forma conveniente e acessível de aprender o básico antes de chegar  de forma inesperada e crua ao volante.