“Gran Fury: a arte não é bastante” no MASP

Exposição parte da programação sobre divertidade LGBT+ discute e expõe os traumas vividos na epidemia da AIDS
por
Jorge Nagib Koike
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29/04/2024 - 12h

"Indivíduos unidos pela raiva e dedicados a explorar o poder da arte para acabar com a crise da AIDS", o coletivo de artistas Gran Fury foi fundado em 1988. Consistindo em uma variedade de artistas que trabalhavam próximos ao ACT UP de Nova Iorque, a proposta do Gran Fury era a de produzir imagens (geralmente acompanhadas de textos) propagandísticas para acompanhar as demonstrações do ACT UP. O coletivo produziu trabalhos de protesto em uma variedade de mídias - propagandas de ônibus, jornais falsos, vídeos, cartazes - almejando chocar e surpreender o público a agir e se conscientizar sobre a crise da AIDS. O grupo parou de existir oficialmente em 1992. 

Para uma maior contextualização, o ACT UP (AIDS Coalition to Unleash Power) foi um grupo político que surgiu na epidemia da AIDS que  buscava melhorias através de protestos e ações diretas. Desde o seu começo no fim dos anos 1980, o ACT UP se utilizou de táticas de confronto que buscavam melhorias em diversos aspectos da crise. Preços altos de remédios, falta de fundos do governo e a escassez de honestidade da mídia são alguns exemplos. O ACT UP continua ativo até hoje em cidades como Nova Iorque e Filadélfia.

 

  Membros do ACT UP protestando. Foto: Peter Ansin/Getty Images.
Membros do ACT UP protestando. Foto: Peter Ansin/Getty Images.

Como parte de sua programação anual dedicada às histórias da diversidade LGBT+, o MASP apresenta uma mostra dedicada ao Gran Fury. A mostra conta com diversas obras do grupo, demonstrando a diversidade de seus trabalhos com textos, discursos, pôsteres e as imagens pelas quais o grupo se tornou conhecido. Além disso, também é possível observar fotos tiradas em diversos protestos. 

 

Dentre as artes expostas no museu, podemos observar algumas impactantes como: "Read My Lips", onde o grupo transformou uma promessa de campanha do republicano George H.W. Bush em uma imagem para combater a homofobia com dois homens expostos se beijando;  "Welcome to America", uma imagem feita para um outdoor, na qual o coletivo denuncia a falta de acesso à saúde nos Estados Unidos, com a frase "Bem-vindos à América. O único país industrializado sem assistência nacional à saúde." exposta entre o corpo de um recém nascido; o cartaz intitulado You've Got Blood on Your Hands, Ed Koch, uma denúncia ao prefeito de Nova Iorque da época, que ignorava a necessidade do reconhecimento e do investimento em relação ao tratamento da AIDS.

You've Got Blood On Your Hands, Ed Koch. 1988
Você tem sangue nas mãos (You've Got Blood On Your Hands), Ed Koch. 1988.

Explorando as outras mídias que o Gran Fury utilizavam, o público pode conhecer o anúncio feito para o metrô de Berlim "When A Government Turns Its Back On Its People", uma manifestação demandando o fim do apartheid médico que as pessoas vítimas da epidemia enfrentavam. A audiência da mostra é também apresentada a textos e discursos realizados durante os protestos do ACT UP, entre eles o discurso Let the Record Show, realizado em 1987 e Que la historia muestre, escrito na década de 1980.

 

When a Government Turns Its Back on Its People, Is It Civil War? no metro de Berlim. Foto disponível em The New York Public Library.
Quando o Governo vira as Costas à sua População (When a Government Turns Its Back on Its People) no metro de Berlim. Foto disponível em The New York Public Library.

Em uma das seções da exposição são expostas diversas fotos tiradas nos protestos que o ACT UP realizava em diversas cidades dos Estados Unidos. Em uma dessas imagens, seis pessoas estão sentadas em uma escada protestando a negligência do governo americano vestindo roupas com o slogan que marcou a crise da AIDS, Death = Silence.

 

Para Benjamin, inglês que mora em São Paulo desde 2023, a exposição se mostrou uma excelente forma de introdução ao coletivo e aos desafios enfrentados pela população LGBT+ durante a epidemia e crise da AIDS. Segundo ele, "a mostra, além de ótima, despertou uma curiosidade não apenas pelo movimento que protestava as injustiças do governo, mas também pela arte que surgiu de um momento tão doloroso".  

 

A exposição, com curadoria de André Mesquita, ocupa a galeria localizada no primeiro subsolo do MASP e se encerra no dia 9 de Junho de 2024. Às terças-feiras a entrada é gratuita.

 

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