Governo Bolsonaro intervém em universidades federais

Alunos respondem aos atos de interferência na Universidade Federal de Pelotas
por
Julia Roperto
|
06/04/2021 - 12h

Localizado no estado do Rio Grande do Sul, o campus da Universidade Federal de Pelotas (UFPel) soma-se aos alvos de interferências do governo Bolsonaro. Ao final do mês de fevereiro, Pedro Hallal - até então, reitor da UFPel -  foi notificado através da Controladoria Geral da União, que estaria sofrendo um processo movido pelo órgão em razão de uma denúncia feita por um deputado bolsonarista. Tal investigação, aberta contra Hallal e o professor Eraldo dos Santos Pinheiro, nasceu a partir de críticas ao governo proferidas em uma transmissão ao vivo feita para os alunos no dia 7 de fevereiro. 

          Ex-reitor da Universidade Federal de Pelotas e epidemiologista, Pedro Hall.  (Foto: Charles Guerra/Divulgação)


 

Reitor da Universidade Federal de Pelotas até o ano de 2020, Pedro Hallal tornou-se referência no mapeamento do avanço da pandemia no território brasileiro, coordenando a pesquisa Epicovid. Agora, atuando como colunista na Folha de S. Paulo abordando ciência e saúde pública, Hallal não é visto com bons olhos por apoiadores do governo atual devido a sua postura ativa de críticas à conduta de enfrentamento da covid-19, adotada pela presidência do país. 

 

A denúncia feita em decorrência de um posicionamento oposto ao governo em uma live para estudantes da universidade, foi mais um dos atos de perseguição contra o epidemiologista. Acusado por “manifestação desrespeitosa e de desapreço direcionado ao presidente da República”, o professor enxergou como desfecho para o caso, assinar um termo de ajustamento de conduta que o proíbe de fazer qualquer tipo de manifestação política dentro de ambientes universitários além de ter que atender a um curso de ética no serviço público. 

 

Como defesa aos ataques dirigidos à universidade e aos professores mencionados, cientistas e acadêmicos, como a Associação Brasileira de Saúde Coletiva (ABRASCO), mobilizaram-se através de manifestos.

 

“Acho que foi um choque pra todo mundo ver dois professores da UFPel tendo que assinar um termo de ajustamento de conduta” diz Fabiana Cândido, estudante de direito da universidade. Fabiana complementa que, o caso demonstra como o governo segue à espreita, observando os movimentos dos docentes e discentes, pronto para intervir da forma que preferir. “Sinto, especialmente por parte dos docentes da universidade, que há no momento um clima de "medo", um receio de conseguir de fato exprimir suas opiniões.”comenta a estudante. 

 

Fabiana aponta que desde 2019, a UFPel sofre por consequências do governo Bolsonaro. Segundo a mesma, quando houveram cortes nos repasses financeiros, os alunos, por vezes, tiveram que ter aulas no escuro como forma de economia além de terem ocorrido turbulências no momento em que o projeto Future-se - desenvolvido pelo MEC - esteve em discussão.

 

Um pouco antes do processo contra os docentes acontecer, a universidade preparava-se para a recepção de uma nova reitoria, escolhida através de uma eleição democrática. Em meados de novembro de 2020, todos já tinham conhecimento da chapa vencedora. No entanto, em janeiro deste ano, o corpo estudantil foi surpreendido com a notícia de que o reitor eleito através dos alunos, Paulo Ferreira Júnior, não seria acatado pelo governo. 

 

Ao invés do primeiro nome colocado na lista tríplice, o presidente escolheu para se encarregar da reitoria, a professora Isabela Fernandes Andrade. 

 

Universidade Federal de Pelotas, Imagem: UFPel Portal.

 

“Como estudante da UFPel, fiquei muito desconfortável com essa notícia, porque acredito que todas as universidades devem ter sua autonomia, principalmente as federais.” diz Regina Vieira, estudante de direito da universidade.  “Se um governo está interferindo na democracia de uma universidade, até que ponto ele poderá interferir na democracia do país? São pequenos atos que nos levam a temer outras coisas” complementa. 

 

Patrocinadas pelo presidente, duas medidas provisórias foram criadas para tentar modificar o formato de escolha dos reitores em uma tentativa de reduzir a autonomia das instituições. A primeira, em 2019, não agradou parlamentares e a segunda, em 2020, procurava autorizar nomeações sem a realização de consulta à comunidade. Ambas propostas não tramitaram. 

 

Diante das tentativas de intimidação contra professores e reitores federais, há de se observar o reflexo desses atos nos alunos. “Não temos como estabelecer um termômetro para todos os estudantes, mas acho que quanto mais informado e engajado ao movimento estudantil, aos professores e a universidade em si, mais preocupadas essas pessoas estão.” avalia Fabiana Cândido. A estudante comenta que, assim como outros colegas, segue preocupada. “Não tanto com a troca da reitoria” pois, segundo ela, a universidade apresentou uma boa desenvoltura ao lidar com o caso, “mas com a incerteza política que nosso país está vivendo e como o governo Bolsonaro pode continuar afetando o funcionamento das universidades públicas federais.”




 

Tags: