O novo coronavírus chegou oficialmente no Brasil no final de fevereiro, e sem muitas surpresas se concentrou nas grandes cidades, principalmente São Paulo e Rio de Janeiro. Entretanto, o vírus não se restringiu apenas às capitais. Cidades menores do interior também estão tendo que lutar contra a Covid-19, e com muito menos recursos e apoio.
Esse é o caso de Conselheiro Lafaiete, em Minas Gerais. Localizada a 96 quilômetros de Belo Horizonte, a cidade é a 22ª mais populosa do estado, com uma população estimada de 128.589 habitantes. A cidade já soma, até este momento, 12 casos confirmados, e as medidas para desacelerar esse crescimento foram tomadas com antecedência, já que, como a maioria dos municípios do interior, Conselheiro Lafaiete não possui infraestrutura para lutar contra uma pandemia.
O isolamento social é o único recurso disponível. Por isso, há mais de um mês escolas e creches, assim como clubes e casas de festas, estão fechados e, surpreendendo muitos lafaietenses, o comércio também seguiu essa recomendação. A surpresa é fácil de entender: o comércio é a alma da cidade, o que a move e garante seu funcionamento.
Conselheiro Lafaiete, ao contrário das outras cidades mineiras, não é conhecida por sua beleza histórica, ou suas atrações turísticas, nem mesmo por ser "palco" das grandes mineradoras que imperam no estado. A cidade tem como principal atividade econômica o comércio, tido como referência em toda a região da zona da mata mineira.
Em 2013, o jornal Estado de Minas já dizia: "Conselheiro Lafaiete é ideal para abrigar um centro comercial". Segundo levantamento feito pelo Ibope Inteligência a pedido da Associação Brasileira de Lojistas de Shopping (Alshop), naquele ano Lafaiete tinha uma demanda de consumo anual estimada em R$1,05 bilhão, considerando os 11 municípios de influência no entorno da cidade. Hoje, com certeza esses números são bem maiores. Por isso, além de surpreender a população, o fechamento dos estabelecimentos comerciais preocupou as entidades responsáveis, que passaram a temer um colapso econômico na cidade.
Na tentativa de superar essas adversidades, muitas soluções criativas têm surgido por parte dos comerciantes do município. Supermercados, com o intuito de conter aglomerações, estão entregando as compras em casa e se juntaram a algumas lanchonetes e restaurantes na divulgação dessa nova forma de serviço. Lojas dos mais variados tipos estão atendendo por delivery; há um número em que você informa o que deseja e seu produto é entregue em casa. E há também os estabelecimentos que estão funcionando como drive-thru; apenas uma "portinha" fica aberta, e através dela são feitos os pedidos e realizadas as entregas das compras.
Criatividade e reinvenção são as palavras da vez, e é assim que Ivone Albuquerque vai tentando administrar a joalheria e relojoaria no centro da cidade. "Eu tive que me dividir. Estou indo sempre na loja, fotografando os produtos e enviando para os clientes. Normalmente o cliente escolhe pelo WhatsApp ou pelo Instagram a partir das fotos que eu envio. Eu passo o preço e eles fecham comigo. Eu entrego na casa deles ou eles retiram comigo aqui em casa", relata a empresária.
Assim como outros comerciantes da cidade, Ivone colocou todos seus funcionários em férias coletivas: "Não temos intenção de estar fazendo demissão, a gente está tentando fazer de todas as formas para manter a equipe", conta a empresária.
A demissão em larga escala é a grande preocupação do empresário Aloísio Rezende, presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas de Conselheiro Lafaiete (CDL). Segundo ele, muitas empresas já estão demitindo, muitas estão fechando e as que sobreviverem vão enfrentar um grande retrocesso. "Alguns comércios trabalham com delivery, outros que não trabalhavam passaram a utilizar. Vamos trabalhando com delivery e com a divulgação nas redes sociais. Porém não são todos que conseguem. Aqueles que não conseguem estão correndo muito risco, até mesmo de falência, o que gera o desemprego", relata Aloísio.
Mesmo com todas essas tentativas de solução, os resultados estão longe de ser os melhores. Na visão dos comerciantes da cidade, além de o isolamento social impedir a ida dos clientes às lojas, são muitos os que deixam de comprar pois ainda não receberam o salário ou estão com medo de não receber.
"Às vezes eu converso com dez a 20 pessoas ao dia, enviando foto, mandando preço e tudo mais, e consigo concretizar quatro vendas com produtos mais baratos. Muita gente está analisando muito para comprar. Então, isso tudo está sendo uma cadeia, a gente tem que se virar de verdade e tentar suprir nesse momento o que seria o mais importante, que seria a folha de pagamento dos nossos colaboradores", diz Ivone.
Para o presidente da CDL, isso tudo é um ciclo sem fim. "Se você tem desemprego, não tem consumo. Não tendo consumo, as lojas vão vender menos e assim vai, é o ciclo. Se não tem consumo, não tem desenvolvimento. É o capitalismo, a roda tem que girar".
Aloísio prevê que o comércio vai demorar a recuperar o movimento de antes, e a palavra do futuro para os lojistas é reinvenção. "Quem sobreviver vai ter que achar o melhor caminho para poder se reinventar, para poder se manter, porque infelizmente o impacto econômico já está sendo alto e, quanto mais tempo demorar, maior vai ser o número de empresas que vão falir", diz o dirigente.
Diante disso, a melhor coisa a se fazer no momento é o que Ivone e vários outros comerciantes estão fazendo: uma junção entre criatividade e e disposição para se adequar às circunstâncias.