Eu de você: o que seria de nós sem o outro?

Denise Fraga quebra o silêncio e nos faz enxergar com os olhos do outro em seu atual espetáculo
por
Maria Clara Magalhães
|
23/10/2023 - 12h

Em um domingo de setembro (17), a atriz Denise Fraga estrelou em mais uma noite o espetáculo “Eu de você”, idealizado e pensado inteiramente por ela, ao lado do diretor Luiz Villaça e do produtor José Maria. Nove anos do programa “Retrato Falado” não bastaram para que a artista contasse histórias reais ao espectador e, no Teatro na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (TUCA), Denise trouxe mais narrativas genuínas para mostrar que não há melhor espelho do que o outro. 

Um cenário inteiramente branco, uma cadeira de madeira e roupas acinzentadas foram os apetrechos necessários para que a obra embarcasse em várias esferas. Apesar de ser um monólogo, a quarta parede foi quebrada e a peça não se limitou ao palco. Mais a fundo, o jogo de iluminação de Wagner Antônio foi um personagem essencial para explicitar a multiplicidade de experiências, espaços e sentimentos que cada corpo experimenta, aflorando assim, o sensorial do público. 

Denise Fraga vestida de cinza sentada em uma cadeira no palco
Denise Fraga encenando. Foto:Divulgação/Thiago Beck

Contando com mais elementos, a peça explorou o universo da música. Denise, ao lado de três musicistas, Ana Rodrigues, Clara Bastos e Priscila Brigante, trouxe mais vida ao espetáculo com clássicas canções: passando de Dostoievski, Fernando Pessoa, Chico Buarque, Elvis Presley até Zezé di Camargo. Apesar do musical vasculhar tantas faces interativas, ao se despedir do público, a atriz proferiu ainda no palco “o silêncio é um espaço não vazio livre de palavras”, revelando assim, ainda mais, os momentos reflexivos propositais, pensados pelo espetáculo. 

É preciso ser Eu de você. Se vive e se entende a vida a diante das experiências pessoais, que são diferentes a partir de cada indivíduo. Com isso, o que seria de cada pessoa se houvesse a tentativa de ver mais o outro, de enxergar mais através do olhar do outro? No espetáculo, Denise traz essa sensibilidade ao encenar diversas histórias reais, de pessoas que escolheram contá-las. Entrevistas, cartas e depoimentos de sujeitos espalhados pelo país originaram o solo, e é encantadora a forma que a atriz vive as vozes, os gestos e os jeitos de cada “personagem”. 

Desde a personagem Tânia, a qual representa a vida urbana volátil, o Júlio, que frequenta karaokês e se apaixona por um assaltante, ou Clarice, que encontra um pedido de perdão no entardecer de um parque, Denise com seu dom artístico faz o público se sentir próximo ao ato, mesmo que não se identifique tanto com essa pessoa. Por um momento, todos se reúnem em um só suspiro, representados pelos problemas daqueles depoimentos, mesmo que nunca tenham passado por algo semelhante. Mas acontece que, no espaço não vazio, livre de palavras, o pensamento percorre o eco em busca de uma só coisa: a resolução das questões que a vida propõe.

Tags: