Localizado em um edifício de arquitetura secular na Santa Ifigênia, centro histórico de São Paulo, um convidativo ambiente anuncia por meio de placas que se está entrando em um lugar carregado de significados. Eis o Memorial da Resistência de São Paulo. Administrado pela prefeitura, o local que serviu como centro carcerário e de tortura durante o regime golpista, hoje é um espaço dedicado a relembrar esse condenável momento da história do Brasil.
Estrutura histórica
Após passar pela bilheteria e adquirir seus ingressos, os quais são gratuitos e também podem ser reservados pelo site do museu, a detalhada e interativa exposição começa. Organizada em quatro módulos, os visitantes têm a oportunidade de ler cartas e escutar depoimentos de pessoas que ali foram confinadas e torturadas, além de poderem entrar nas quatro celas do antigo Departamento Estadual de Ordem Política e Social de São Paulo – Deops/SP, e no corredor onde os presos tomavam banho de sol.
Com a explicativa jornada proporcionada pelos escritos nas paredes da instalação, que remontam desde antes do golpe militar de 1964, até o começo da última década, uma viagem no tempo é possível. Mais adiante a atmosfera pesa e um desconforto pode ser sentido diante dos relatos e dados expostos nas celas de como era viver em um ambiente tão pequeno mas que comportava entre 16 e 18 presos segundo a organização da mostra. “O que mais me impactou nas celas foi o banheiro, que tinha só uma luz bem fraca. Eles viviam praticamente no escuro”, conta Victoria da Silva, estudante de jornalismo.
Além disso, nos dois corredores do desativado complexo penitenciário, os sentimentos de quem ali permaneceu por anos são trazidos à tona, como o medo e a esperança. O material audiovisual disponibilizado também impacta ao narrar histórias de figuras que foram torturadas no Deops durante a ditadura militar, e para quem prefere o analógico, cartas e bilhetes de presos estão disponíveis para leitura logo ao lado das entradas das celas.
Local de Memória
Apesar do espaço criado em 2009 ter como objetivo mostrar as atrocidades cometidas pelos militares de forma geral no país e chamar a atenção para a necessidade de valorizar a democracia e os direitos humanos, com relatos de pessoas de vários estados, o foco do local é o papel de São Paulo no regime militar. Como se deram as perseguições e prisões na cidade, e as articulações entre políticos e militares antes, durante e após a ditadura.
Iniciado oficialmente em 31 de março de 1964 e concretizado em 1 de abril, o golpe militar foi possibilitado perante o apoio, convivência e traição por parte de agentes públicos e atores civis. Segundo o Relatório da Comissão da Memória e Verdade da Prefeitura de São Paulo, militares instalados na cidade como Amaury Kruel, comandante do II Exército, empresas com sede no estado como Pfizer, Volkswagen e Eucatex, e movimentos civis realizados em São Paulo como A Marcha da Família Com Deus Pela Liberdade, foram ímpares a concretização do golpe, e a exposição trata do papel de destaque paulista.
Funcionando todos os dias da semana das 10h às 18h, exceto às terças-feiras, o Memorial da Resistência ainda conta com as exposições temporárias Resistências na PUC-SP e Mulheres em Luta, ambas em relação à ditadura militar. De fácil acesso por trem, metrô e ônibus, o museu se traduz como um farol de luta e memória no centro de São Paulo que grita por aqueles violentados e assassinados por buscarem liberdade, respeito ou qualquer coisa que não fosse a tirania. Um local de reflexão e recordação a respeito de uma época inesquecível que deve ficar no passado.
Esta matéria foi produzida como parte integrante das Atividades Extensionistas do curso de Jornalismo da PUC-SP.