Embate dos juros dita o clima da economia

Decisão do Banco Central de manter Selic em 13,75% revela conflito entre duas visões antagônicas
por
Enrico Souto e Thaís Leoni
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28/04/2023 - 12h

“É só ver a carta do Copom para a gente saber que é uma vergonha a explicação que deram para a sociedade brasileira”, afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, durante posse de Aloizio Mercadante na presidência do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). O atual Presidente da República tem assumido com força, desde o início do seu mandato, um tom combativo contra o Banco Central que, através do Comitê de Política Monetária (Copom), decidiu por unanimidade, em duas reuniões consecutivas, manter o nível da taxa Selic em 13,75%, onde se encontra estacionada desde agosto de 2022.  

Quase três meses depois da primeira reunião do Copom, os atritos entre Lula e Roberto Campos Neto, presidente da autoridade monetária, só fizeram piorar. Para Lula, estabilizar a taxa em um patamar tão elevado, em um momento tão crítico para a economia brasileira, é um descaso com a população. Ele chegou, inclusive, a questionar a legitimidade da autonomia do BC, afirmando que seria do interesse de empresários manter os juros altos. 

 

Aliados do presidente reforçaram suas críticas. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, acredita que “houve uma reação do Banco Central às atitudes do governo anterior no período eleitoral, que ensejou aumento da taxa de juros”. Já Simone Tebet, ministra do Planejamento e Orçamento, fez um apelo ao BC, pedindo por “um gesto positivo, a favor do Brasil” 

 

A taxa Selic 

A Selic, é a taxa básica de juros de economia, sendo um valor referencial para fixação de juros cobrados por instituições financeiras. A sigla remete ao Sistema Especial de Liquidação e Custódia. Seu sistema é uma plataforma do Banco Central, em que são realizadas as operações de compra e venda de títulos federais. A oferta dos títulos é como se o Estado estivesse pegando empréstimos com investidores (pessoas físicas, bancos ou empresas) para pagar suas dívidas.  

Na prática, a média dos juros cobrados do governo pelo dinheiro que foi emprestado é a taxa Selic. Para o Banco Central, ela é a principal ferramenta para o controle de inflação, e interfere diretamente no uso de crédito e na tomada de empréstimos. Quanto mais alto os juros, maior o custo para pegar dinheiro emprestado, assim, cria-se uma pressão para redução do consumo. 

 

 

 

Se ocorre uma diminuição de demanda pela aquisição de bens e serviços, a tendência é que a inflação caia ou entre em estagnação.  

Apesar do veredito do Copom, que decidiu manter a Selic em 13,75% pela quinta vez consecutiva, Lula declarou que continuará lutando para que não aconteça esse aumento. Ele classifica a taxa como absurda e afirma que o país não tem inflação de demanda, o que impactou no mercado de tal forma que a curva de juros e câmbio se modificou.   

De acordo com o Copom, a decisão de manter a Selic tem se dado porque existe um cenário turbulento na economia e no sistema bancário global, o que pode causar pressão para as questões inflacionárias globais. O arcabouço fiscal e a inflação ao consumidor também são uma preocupação. 

 

Por trás do conflito 

Para Marcos Henrique do Espírito Santo, professor e mestre em economia política, a motivação para a definição da taxa Selic está na visão econômica do Banco Central, que ainda é muito ortodoxa. “A organização se apoia em um receituário monetarista, que enxerga na inflação um dos únicos problemas da economia. Então, com o argumento de conter a inflação, a taxa de juros é elevada, que é um modus operandi posto em prática desde a pandemia”, afirma.  

Entretanto, de acordo com ele, essa não passa de uma falácia. O argumento seria que a taxa de juros controla a inflação que, baseada na demanda, cresce conforme o consumo aumenta e o mercado se aquece. “Mas a inflação com que lidamos no Brasil hoje tem origem em oferta e custos – no choque entre o petróleo e outras commodities, por exemplo – e, nesse caso, o controle que a taxa de juros teria é pequeno”, pontua 

Segundo Marcos, o conflito também revela fortes interesses políticos. “Hoje, o Brasil é o maior pagador de juros do mundo, o que faz com que, para os grandes investidores, o país tenha se tornado um verdadeiro paraíso financeiro. E, como a liderança do BC sempre tem uma relação íntima com os bancos, essa taxa se torna uma conveniência”, acrescenta. 

Sendo assim, a curto prazo, a diminuição da taxa Selic sinalizaria o barateamento do crédito no país, abrindo espaço para que a roda da economia volte a girar, sobretudo no varejo, que é um dos setores mais afetados por este contexto, como mostrou o caso Americanas. “Agora, a longo prazo, aí sim, a diminuição da taxa Selic pode ser um excelente auxiliar para o crescimento econômico”, avalia.  

Marcos conclui reiterando que, dentro da economia, não existem julgamentos morais, como ‘certo’ e ‘errado’, e sim matrizes teóricas diferentes e, a partir do choque entre elas, ditarão quais interesses ganham e quais perdem: “Nesse caso, o conflito se estabelece entre quem está a favor de um diagnóstico que beneficia o mercado financeiro, e quem está a favor do crescimento econômico, da distribuição de renda e de um maior investimento pú