E você luta por quê

por
Giovanna Takamatsu
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23/10/2023 - 12h

Bandeiras levantadas na frente da reitoria da Universidade de São Paulo (USP); todas por alunos e movimentos estudantis. Nelas, reinvindicações de permanência estudantil e contratação urgente de professores. Assembleias estudantis, decidindo o futuro da faculdade, se irá aderir ou não. Vários jovens diferentes se organizando – sozinhos, sem ninguém para guiá-los, fazendo o que acham mais certo – para atingirem um objetivo em comum: educação de qualidade.

“Eu acho que é importante que a juventude esteja organizada, militando, porque a gente pensa muito na nossa realidade, no agora”, diz Daniela Oliveira. “A intenção da juventude estar militando é que ela construa hoje, coloque uns tijolinhos, para que lá no futuro a gente tenha construído algo diferente do que a gente tem hoje”. Daniela hoje é militante pelo coletivo Ecoar, juventude ecossocialista afiliada ao Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). Jornalista por formação, ativista por vocação. Ela luta por insatisfação. Um desagrado por sua realidade. “Eu sei que essa realidade ela não vai ser transformada sem que eu faça algo para que ela seja transformada”.

Era segunda-feira, 18 de setembro, por volta das 19 horas. Prédios fechados na cara dos estudantes. Não era permitido entrar no prédio da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências (FFLCH). Quem estava dentro, expulso. “Fizeram a leitura de que foi uma estratégia pra não dar tempo da galera se organizar hoje”, disse Anna Beatriz Lousa, aluna de pós-graduação da USP, e militante do Ecoar também. “Pura emoção, a moça fazendo a fala e tendo que descer as escadas porque tavam fechando o prédio”.

A reitoria agiu antes de ser encurralada pelos alunos, fazendo o impensável. “Antes da greve estourar, o reitor, Paulo Martins, com medo de estourar uma greve, o que ele fez? Fechou o prédio da FFLCH e expulsou todo mundo que estava lá no prédio”, conta João Guilherme Falavigna. “Nisso ele deu um tiro no próprio pé. A FFLCH inteira conseguiu se organizar e fazer uma Assembleia Geral dos Estudantes”. Foi realmente o estopim. Depois disso, a aderência a greve só cresceu. João, que é estudante de psicologia na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), também é militante pelo Ecoar. “É isso (militar) que me dá sentindo de vida, é isso que me dá razão de viver”, afirma.

Às 20 horas, no mesmo dia 18. “Assembleia extraordinária no vão da História e Geo”, anuncia Calisto do Carmo, estudante da USP. “Greve estralando já”.

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“Já piquetamos hoje mesmo!”. Imagem: Leo Silvério, estudante da USP

Os que não militam

O que está acontecendo na USP talvez seja uma raridade atual – mas talvez uma raridade ainda maior seria a ausência total de protestos estudantis. Durante a última votação de delegados estudantis para o 59º CONUNE (Congresso da União Nacional dos Estudantes), se ouviu, dentro da Pontifícia, um grito implorando pelo engajamento. “Quase não alcançamos o quórum em 2019”, diz João, que estava organizando a Chapa 1 – Sementes de Marielle. “Não temos nem DCE (Diretório Central dos Estudantes) aqui na PUC”.

Foram computados 1099 votos ao todo, dentro de uma universidade com quase 19.000 alunos, em 2023. 

“Antes da pandemia, a gente tinha um movimento mais ativo. Pelo menos eu via mais pessoas engajadas dentro da PUC”, enfatiza Daniela, que também fez parte da Chapa Sementes de Marielle. “Eu acho superlegal que a gente tem iniciativas individuais e no jornalismo tem muito isso, mas falta um pouquinho essa ideia de coletivização das lutas”. Militar sozinho é um desafio. Mudar o mundo sozinho é impossível.

O militante cansado

Acordar. Se arrumar. Pegar ônibus, trem, metro. Chegar na faculdade. Estudar. Sair. Pegar mais um ônibus, trem, metro. Estagiar. Pegar mais um ônibus, trem, metro. Chegar em casa. Repetir. 

A vida de um jovem já é cansativa por si só. Talvez seja por isso a indisponibilidade para lutar. “A juventude é paradoxal. A juventude, ao mesmo tempo que ela é um dos setores mais explorados e oprimidos pelo capital, é a classe que mais tem disponibilidade, não disponibilidade para lutar, mas é isso, tipo, período da juventude, a gente é jovem, a gente tem energia para tocar as lutas”, diz João. A juventude está trabalhando muito e recebendo pouco. A juventude tem dois turnos de trabalho no dia. Vai para faculdade, passa lá no mínimo 6 horas. No contraturno tem que estagiar, por mais 6 horas, para ganhar uma merreca. Passam muito tempo no transporte público. Isso move muito a luta da juventude.

Acordar. Se arrumar. Pegar ônibus, trem, metrô. Chegar na faculdade. Estudar. Sair. Pegar mais um ônibus, trem, metrô. Estagiar. Pegar mais um ônibus, trem, metrô. Ir da USP até o Largo da Batata. Panfletar. Fazer campanha. Agitar bandeira. Discursar. Pegar ônibus, trem, metrô. Chegar em casa. Repetir

Quando se adiciona com a militância, a vida se torna ainda mais dura. “É um pouco pesado, eu diria assim, porque além de estudar e trabalhar, você tem mais alguma coisa para tomar seu tempo”, afirma Daniela. “Essa experiência é um pouco difícil, cansativa com certeza, principalmente porque nem sempre a gente vê resultado do que a gente tá fazendo”.

Mas não podem parar. Se estagnarem, quem vai à luta?

Afinal, não estamos nem perto de uma condição razoável. Educação em risco, educação mercadológica. Jovens pretos morrendo, jovens pretos e pobres sendo encarcerados em massa. Problemas que atravessaram a história. O jovem precisa lutar agora, para um futuro igualitário e justo. 

Esta reportagem foi produzida como atividade extensionista do curso de Jornalismo da PUC-SP.