E se Tropa de Elite fosse lançado em 2021?

14 anos depois, “Tropa 1” chegaria em um contexto de polarização política e com um governo apoiador do armamentismo.
por
Guilherme Deptula
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16/11/2021 - 12h
 

         Quando Tropa de Elite chegou aos cinemas, em 2007, o Brasil parou. Mesmo com o escândalo de pirataria no pré-lançamento, o filme fez com que todos pagassem o ingresso para assistir mais uma vez. E quando digo “todos”, quero dizer todos realmente. O longa atraiu desde aqueles obcecados pelos blockbusters hollywoodianos, até os mais apreciadores do cinema cult. O que resultou em uma das maiores bilheterias do ano e o filme mais comentado do Brasil. Tropa de Elite foi um fenômeno.

Mas, depois de 14 anos do lançamento do primeiro “Tropa”, muita coisa mudou. Em meio a um mundo rodeado pelas redes sociais e pela polarização política, uma questão me veio à mente: Como seria se “Tropa de Elite” fosse lançado em 2021?

 

Imaginemos que o longa chegaria para reabertura dos cinemas no Brasil e iria mobilizar milhares de pessoas. O impacto seria tão grande quanto foi em 2007, com todos comentando sobre as questões sociais que o filme aponta.

“Geraria um debate rico e polêmico ao mesmo tempo.”, afirma o professor de Estética de Cinema, Mauro Luiz Peron. E continua: “Questões como o armamento, a função da polícia e desigualdade social seriam mais exploradas em 2021 do que em 2007.” A partir dessa visão, os debates estariam presentes em diversos lugares, desde conversas entre amigos até as redes sociais.

Porém, em meio a uma era de antagonismo político, é um fato de que as discussões entre os extremos só se intensificariam. Sendo que o próprio filme sugeriria a polarização a partir da história de um personagem: André Mathias.

Cena do filme "Tropa de Elite". Retirado do site UOL.com. FONTE: Divulgação
Cena de "Tropa de Elite" (2007), retirado do site UOL.com. FONTE: Divulgação

O arco do Mathias se baseia nele tentando equilibrar-se entre dois opostos. Por um lado, ele é um policial que combate o tráfico nas periferias, e por outro, é um universitário que convive com jovens que se opõe a ação da polícia nos morros cariocas. Mesmo seus colegas não sabendo de sua profissão, Mathias lida bem com a vida dupla, até que seu amigo, Neto, é morto cumprindo um favor seu.

O assassinato faz André Mathias se transformar. Ele desiste da faculdade, rompe suas relações com os colegas e se torna um policial do BOPE, mergulhando-se na figura militar para sempre. Com isso, o filme sugere que é incabível ser policial e conviver com universitários de esquerda. É incabível estar nos dois lados. E, para confirmar o ponto, a todo momento em que Cap. Nascimento narra (em off) a história do Mathias, ele escancara que sua vida dupla não daria certo. E, esse fato, seria o argumento perfeito para os extremos políticos se distanciarem cada vez mais um do outro.

Agora, sabendo que Tropa de Elite intensificaria a polarização política, é claro que os dois lados interpretariam o filme diferentemente.

 Imagino que o longa seria visto pela extrema direita como uma forma de representação visual do que as políticas de Bolsonaro tentam reproduzir: um homem incorruptível, respeitado e honesto. Isso faria com que os apoiadores do presidente se exaltassem e destaquem a importância do armamento para a proteção de uma suposta liberdade e justiça do cidadão.

Com isso, o lançamento de Tropa de Elite hoje poderia, de certa forma, auxiliar na reeleição de Bolsonaro em 2022. Como justifica Mauro:” A exaltação da extrema direita, com o filme, poderia ser um triunfo contra a esquerda nas eleições, retroalimentando a ideia de armamentismo e aclamando a força policial.” Esse fator, poderia unir a direita e concentrar suas forças no auxílio a Bolsonaro e levá-lo a presidência por mais quatro anos.

Entretanto, pela perspectiva da esquerda, acredito que seriam destacados outros pontos, como suposto pelo professor Peron: “Penso que os grupos de esquerda apontariam para a brutalidade policial e a discriminação social, fazendo o filme funcionar mais como um modo de denúncia.”

 A esquerda evidenciaria como o cotidiano brutal afetava os moradores das periferias, demostrando o abuso de autoridade dos policiais. Além disso, poderia usar a violência explicita do filme contra a própria ideia de armamentismo.

 Argumentariam que, já que nem mesmo um militar treinado teve estrutura mental o suficiente para se manter em um ambiente violento, imagine um civil sem preparo e sem instrução. Só aumentaria as taxas de homicídio, amplificando a violência no Brasil.

Portanto, apesar do novo cenário, Tropa de Elite seria visto de forma diferente, mas não perderia sua profundidade e nem seu crédito. Na verdade, só os potencializaria, mantendo seu posto como um dos maiores filmes brasileiros de todos os tempos.