No dia 31 de março de 2022 completaram-se 58 anos do golpe militar, porém
nunca estivemos tão próximos de uma realidade ditatorial. A crise democrática
brasileira perdura até a atualidade no país com governos de direita, aumento do poder
militar, censuras camufladas por piadas e falas antidemocráticas disfarçadas de
“heroísmo” do atual presidente Jair Bolsonaro.
13 de dezembro de 1968, data marcante em que foi instituído no Brasil o AI-5,
instrumento criado pelo regime militar e executado pelo general Costa e Silva, como
uma maneira de censurar previamente tudo aquilo que ia contra a ideologia do
governo. “Seria o direito do Estado ter um órgão de repressão ao que seria publicado
na mídia, seja ela escrita, falada, televisiva, ou ainda qualquer tipo de expressão
estética, artística”, explica o professor Filipe de Faria Dias Leite, graduado pela
Unesp Franca com mestrado em história social pela mesma instituição.
Como forma de combater as restrições impostas pela ditadura, grandes nomes
da resistência nasceram. Carlos Marighella, símbolo da luta armada no
Brasil, era negro, político, escritor, comunista e fundador da Ação
Libertadora Nacional, uma organização de combate armado da esquerda. Marighella foi
assassinado durante sua batalha pelo Brasil livre. Recentemente, o guerrilheiro foi
homenageado com o lançamento de sua biografia em filme dirigido por Wagner Moura e
estrelado por Seu Jorge, que foi censurado pela Agência Nacional do Cinema como
uma tentativa de ataque aos órgãos culturais. “Ele deve ser lembrado porque não era
apenas um indivíduo de esquerda, que lutou contra a ditadura e resistiu, ele também
era um indivíduo negro, que além de significar uma resistência política ao regime,
significa também uma resistência racial.” - destacou Filipe.
Após 58 anos do golpe militar, ainda é possível enxergar resquícios do AI-5 no
país. Com a ascensão de um governo ultraconservador no Brasil, de Jair Bolsonaro,
feridas abertas - que antes estavam mascaradas - voltaram à tona e escancararam um
país ainda extremamente autoritário e sem lembrança da história que viveu. A
existência de pessoas que se manifestam a favor do fechamento do congresso e a
retomada dos militares, estampa de forma visível a lacuna formada pela Lei da Anistia
no Brasil. A não condenação e impunidade dos torturadores não permite uma
reparação histórica, o que minimiza e até banaliza os danos causados, e abre
oportunidade para que pessoas sejam a favor desse
comportamento, uma vez que não houve punição. “É uma lei que foi feita para anistiar
os responsáveis por essas violências, o Estado inclusive, e isso é um absurdo, é isso
que motiva falas como as do Presidente, de Daniel Silveira, Eduardo e Carlos
Bolsonaro e atos como o do vice -presidente elogiando torturadores e rindo de relatos
de pessoas torturadas, porque eles sempre se escondem atrás da Lei da Anistia”,
reforça Luiz Antônio Dias, pesquisador da ditadura, movimentos sociais e professor do curso
de Ciências Sociais da PUC-SP.
O AI-5 foi um dos grandes momentos de repressão ditatorial do país, como
acrescenta Dias, “De certa forma o AI-5 é o que acaba motivando a ação armada e a
violência imposta por esse ato faz com que o sistema avance no processo de
desmobilização, desmonte e execução dos integrantes dos grupos armados, é um
período muito violento e muito curto”. O conjunto de leis teve seu fim legal junto com a
ditadura, mas como todas as características do período, tem seus resquícios na
atualidade. Durante o festival de música Lollapalooza artistas foram ameaçados com
multas em uma tentativa de silenciamento de opiniões contrárias às do governo atual,
gritos e xingamentos ao presidente Bolsonaro marcaram o festival e trouxeram à tona as marcas retrógradas da censura.
Os aliados ao governo Bolsonaro seguem espalhando elogios aos
anos de chumbo. Durante a Ordem do Dia publicada na quarta-feira (30 de março) para ser lida nos quartéis do país no dia seguinte, aniversário do golpe contra o governo de João Goulart, o Ministro da Defesa, general Braga Netto, escancara a visão das Forças Armadas brasileiras sobre o Golpe Militar, rememorando a Ditadura como um momento de ‘paz e democracia’.