Segunda-feira, 16 de março de 2020. Após uma alta de 4,55%, o valor do dólar supera os R$ 5 pela primeira vez na história. Desde então, a moeda americana passa por altos e baixos em relação ao real, mas quase sempre se mantendo acima dos R$ 5. No dia 24 de abril, após o anúncio do ex-ministro Sérgio Moro (Justiça e Segurança Pública) de que estava deixando o governo, o dólar bateu um novo recorde e fechou a R$ 5,65. A alta acumulada ano chegou aos 35%, com a moeda fechando o mês de abril em R$ 5,43, sem previsão de queda para maio.
Embora influenciada pela instabilidade política, a disparada da moeda americana tem como razão principal a crise econômica provocada pela pandemia de Covid-19. De acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Produto Interno Bruto (PIB) do planeta deve ter uma contração de 3% neste ano, a maior desde a Grande Depressão da década de 1930. Para o Brasil, o FMI espera uma queda de 5,3%, um recuo sem precedentes. A recessão será acompanhada de um aumento de quase três pontos percentuais na taxa de desemprego.
Neste cenário negativo e repleto de incertezas, a alta do dólar tem a ver com o regime de câmbio flutuante que o país adota desde 1999. Por esse sistema, o valor das moedas é determinado pela oferta e pela demanda do mercado. Neste momento, um movimento de fuga de capitais, no qual muitos investidores liquidaram suas aplicações em busca de opções que consideram mais seguras, está fazendo o preço do dólar subir, como explica o economista Alexandre Schwartsman, ex-diretor do Banco Central.
Ou seja, muitas pessoas acabam por trocar investimentos menos seguros em solo brasileiro (retirando dinheiro da economia local) por outros no exterior que apresentam menor risco de perda. "É muita gente vendendo em reais e comprando dólares para poder aplicar lá fora, levando a uma alta significativa", afirma Schwartsman.
A retirada de dinheiro do mercado brasileiro também tem afetado a Bolsa de Valores, que tem sofrido constantes quedas nos últimos tempos. O Ibovespa, principal indicador da Bolsa brasileira, costuma se comportar de maneira inversamente proporcional à cotação do dólar: enquanto um sobe, a tendência do outro é descer.
Enquanto isso, mesmo sendo um dos principais afetados pela Covid-19, os Estados Unidos vivem um movimento contrário. Enquanto o Brasil vê o capital sendo tirado de sua economia, os norte-americanos veem dinheiro sendo injetado, com muitas pessoas, de todo o mundo, comprando títulos de seu governo e sua moeda local.
Um dos principais receios quando o dólar sobe são os impactos na inflação, uma vez que os valores de produtos importados e exportados costumam ser ligados à moeda americana. De acordo com Schwartsman, no entanto, esta não é uma preocupação muito importante no contexto atual. Isso porque, segundo ele, não parece estar havendo um grande repasse no preço destes produtos, o que deve, em alguma medida, ajudar na recuperação do atual cenário de crise.
Segundo o ex-diretor do Banco Central, com a atual cotação do dólar, o Brasil consegue exportar mais facilmente tudo o que é produzido localmente, mas tem dificuldade em importar, o que caracteriza um câmbio desalinhado. Considerando que tudo que é produzido na Brasil acaba ficando mais barato, a exportação deve ser facilitada, o que, para muitos economistas, pode levar à diminuição da concorrência de outros exportadores em relação aos produtos brasileiros.
Além disso, como a importação é dificultada devido ao câmbio, o mercado interno tem que adquirir produtos nacionais. Com isso, quando o ritmo de compras no país voltar ao normal, uma preferência maior deve ser dada aos produtos locais, de acordo com Schwartsman.
Com a velocidade com que o dólar está subindo, o grande medo é de que a moeda americana atinja níveis estratosféricos – ainda maiores do que já atingiu – e nem mesmo os economistas chegam a um consenso sobre o que será do futuro. Alguns acreditam que a moeda possa atingir R$ 6 e outros creem que ficará abaixo de R$ 5. Alexandre Schwartsman é um dos que acreditam na baixa: "Minha impressão – é difícil fazer previsões neste momento – é que me parece um pouco esticado o valor do dólar, na casa do R$ 5,20, R$ 5,30. É mais provável que ele caia do que suba". Segundo a edição de 4 de maio do Relatório Focus do Banco Central – que considera as estimativas de mais de 100 instituições do mercado financeiro – , o ponto médio das previsões para o dólar no fim do ano está em R$ 5.
Schwartsman avalia que os movimentos do mercado têm sido muito mais ditados pelo pânico do que por um raciocínio mais elaborado. Ou seja, com o retorno à situação normal, o patamar buscado pelo dólar deve ser inferior ao de hoje, inclusive abaixo de R$ 5. "Eu não ficaria espantado", diz.
Por ora, não há nada no âmbito econômico que o governo brasileiro possa fazer para reverter o atual quadro de instabilidade, no entendimento de Schwartsman, uma vez que as principais forças do que está acontecendo não vêm de dentro, mas sim de um movimento mundial causado pela pandemia.
"As ações estão muito mais do lado de medidas de saúde pública, que podem mostrar um impacto menor da epidemia no Brasil", diz.
Na visão do economista, o que deve ser feito, mas nem tanto para tentar uma valorização do real e consequente baixa do dólar, mas sim porque é "o absolutamente correto", é mostrar que o país tem estratégias para lidar com o vírus, algo que o governo não tem mostrado, inclusive o presidente Jair Bolsonaro.
Para Schwartsman, o quanto antes o Brasil tiver condições de abandonar a quarentena e o isolamento social, melhor vai ser para a economia local.