Ao caminhar pelas ruas brasileiras é comum ver animais vagando sem rumo, em busca de alimento ou apenas atrás de um pouco de atenção. De acordo com dados da OMS (Organização Mundial da Saúde), há mais de 30 milhões de animais abandonados no país, cerca de 10 milhões de gatos e 20 milhões de cães. Muitos grupos dedicam seu tempo para recolher, adaptar e encontrar uma família para eles.
Bruno dos Anjos, gerente do sítio da ONG Cão Sem Dono, disse que a organização cuida atualmente de quase 450 animais, entre eles cerca de 370 cães e 80 gatos. Ele explica como é o processo de resgate: "Quando recebemos o aviso de um animal que precisa ser resgatado, seja por maus tratos ou por situação de rua, nós vamos até o local, recolhemos ele e começamos a nos preparar para realizar os processos que precisam acontecer para disponibilizá-lo a adoção". Ele também complementa ao explicar que não acolhem animais que já possuem donos, mas desejam deixar de ter o animal por alguma razão.
Após o resgate, os animais precisam passar por procedimentos veterinários a fim de identificar possíveis problemas e deixá-los saudáveis. Carol Perussi, médica veterinária da Clínica Veterinária Popular Cão Sem Dono fala sobre a condição dos animais quando chegam aos seus cuidados: “Normalmente os animais chegam com a doença do carrapato, quase sempre, e também com verme e pulga [...] varia de caso para caso, quando o animal sofre maus tratos ele tá bem abaixo do peso, tem feridas pelo corpo, está bem desnutrido. Quando são cães de rua, eles têm algumas feridas e às vezes um tumor ou um verme." A veterinária esclareceu sobre os procedimentos realizados: "Os animais quando são resgatados, eles passam pelos tratamentos que precisam, seja ganhar peso, cuidar da doença do carrapato, de um tumor. E quando já estão saudáveis nós fazemos a castração, depois as vacinas e a vermifugação para poder disponibilizar para a adoção".
Porém, o animal também precisa se acostumar a conviver com humanos, já que em grande parte das vezes, eles chegam nos lares temporários com experiências emocionais fortes e que precisam ser tratadas. Segundo o adestrador de cães Marcos Melo o animal sofre com “traumas, alguns têm medo de pessoas, barulho de moto, de caminhão, de bombas e até de outros cães, o que dificulta a aproximação dos cuidadores”. Bruno contou sobre os procedimentos de adaptação feitos pela ONG Cão Sem Dono com cães vítimas de maus tratos: “Quando o animal passa por maus tratos, ele tem medo do humano, aí o que nós fazemos? Entramos no canil mas não vamos atrás do animal, eu sento aqui, de costas, coloco um petisco no chão e fico aqui, deixo ele se aproximar de mim, deixo o animal pegar confiança, não tento forçar ele a ficar perto de mim”.
Em alguns casos os animais são adotados antes mesmo de chegar às organizações, como o caso de Preta, uma gatinha adotada ainda filhote por Ester Lessa: “Eu adotei ela com uns dois meses mais ou menos, meu irmão ficou sabendo porque um amigo dele repostou um post de uma outra menina, aí ele viu e pegou ela.” Ester acredita que Preta não sofreu maus tratos antes da adoção por ser uma gata muito dócil: “ela gosta de brincar, gosta de carinho, ela não arranha na maldade se arranha ela tá brincando”.
Um caso diferente é o de Mike, adotado por Laís Bonfim com 3 meses de vida e que, apesar de não ter nascido na rua, teve dificuldades no processo de adaptação à nova família: “Foi bem difícil, ele chorava a noite e tinha muito medo”. Laís relata sobre o comportamento dele ser reflexo dos maus tratos sofridos pela mãe enquanto estava na rua: "Ele nasceu na ONG, não foi resgatado. Mas a veterinária disse que ele pegava os traumas da mãe, então ele era realmente muito medroso”. Outro comportamento comentado por Laís é o medo de barulho, homens e de crianças que, para ela, foram adquiridos em outros lares que o cão passou: “toda vez que ele vê uma criança fica muito agitado, começa a se esconder e homens também, principalmente, gente alta”.
Nem todo processo de adoção é igual, Bruno dos Anjos explica como são avaliados os possíveis tutores na ONG Cão Sem Dono para que o bem estar do animal seja mantido: ”Não adotamos para qualquer um, não é só chegar e querer o animal, nós conduzimos uma entrevista com o interessado, para saber se ele tem condição de cuidar do animal, se tem a responsabilidade, se vai conseguir realmente cuidar do bicho”.
Bruno finaliza ao dizer como as pessoas podem ajudar os grupos de resgate: "Hoje a parte mais importante para nós é a divulgação, claro que a parte financeira é importante, até porque temos que comprar ração e pagar as contas. Também é muito importante termos pessoas voluntárias para ajudar com os trabalhos. Mas o mais importante de tudo é a divulgação do nosso projeto, é levar os animais em estações do metrô (existe uma parceria entre a ONG e o metrô de São Paulo que os permite realizar feiras de adoção nas estações), em faculdades, postagens em redes sociais, porque aí nós conseguimos levar nossos animais para as pessoas conhecerem. Nós precisamos que eles sejam adotados para poder resgatar novos animais".