Crise da Covid-19 afeta mais as mulheres

por
Maria Fernanda Favoretto
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04/05/2020 - 12h

Por Maria Fernanda Favoretto

Elas são maioria entre os trabalhadores informais e desempregados, as mais prejudicadas pelas disparidades salariais e vivem sobrecarregadas pelos cuidados domésticos. Historicamente, esta é a realidade enfrentada pelas mulheres. Com a pandemia da Covid-19, no entanto, a vulnerabilidade feminina ficou ainda maior.

Em nota divulgada no dia 24 de março, a ONU Mulheres confirmou esse quadro desfavorável. “A maioria das mulheres trabalha na economia informal, onde o seguro de saúde provavelmente não existe ou é inadequado e a renda não é segura. Como elas não são contempladas por ajuda financeira, acabam não tendo suporte”, disse no comunicado a sul-africana Phumzile Mlambo-Ngcuka, diretora-executiva do órgão.

Mlambo-Ngcuka disse também que a maioria dos profissionais de saúde são mulheres, o que as coloca em maior risco. “Muitas delas também são mães e cuidadoras de familiares. Elas continuam carregando a carga de cuidados, que já é desproporcionalmente alta em tempos normais”, comentou.

No Brasil, segundo informações da ONU Mulheres, 85% dos profissionais da enfermagem, 45,6% dos médicos e 85% dos cuidadores de idosos pertencem ao sexo feminino. Ou seja, não são elas apenas as mais afetadas social e economicamente, mas as mais vulneráveis ao contágio do coronavírus.

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou no mês de fevereiro dados sobre a taxa de desemprego do quarto trimestre de 2019. O número, que faz parte da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (Pnad), mostra que a atual taxa de desocupação gira em torno de 11,9%. O mesmo índice sobre as mulheres brasileiras foi calculado em 13,1%, superior à taxa masculina, de 9,2%. Entre a população desempregada, mulheres também somam a maioria: 53,8%.

Em matéria publicada no dia 27 de março no portal Valor Investe, o economista-chefe da Genial Investimentos, José Márcio Camargo, projetou que os primeiros e mais afetados pela falta de emprego serão os trabalhadores informais, ou seja, aqueles que não têm suas atividades regulamentadas pelo Estado, e que representam 40,7% da força de trabalho ocupada no país, ainda conforme a Pnad referente ao quarto trimestre de 2019.

Segundo a "Síntese de Indicadores Sociais 2019 - Uma Análise das Condições de Vida da População Brasileira", divulgada em março pelo IBGE, a proporção de mulheres em ocupações informais no Brasil é de 41,6%, tendo principalmente maior atuação no trabalho auxiliar familiar e no trabalho doméstico sem carteira assinada.

Em âmbito domiciliar, dados publicados pela Agência IBGE Notícias em setembro do ano passado mostram que a taxa de realização de afazeres domésticos em domicílio é de 92,2% para as mulheres e 78,2% para os homens. Ou seja, as mulheres dedicam, em média, 21,3 horas por semana a esse conjunto de atividades, enquanto os homens, apenas 10,9 horas. Ou seja, frente à pandemia do coronavírus e à alta esperada no desemprego, as poucas privilegiadas que não serão demitidas e poderão trabalhar em home office terão que alinhar o serviço a uma rotina de cuidados com a casa e a família.

Para muitas mulheres, infelizmente, o vírus e os problemas econômicos não são os únicos desafios. Como consequência do processo, a taxa de violência doméstica também aumentou. No Brasil, o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos informou que a quarentena gerou uma alta de quase 9% no número de ligações para o Ligue 180, canal que recebe denúncias de violência contra a mulher. Enquanto a média diária entre os dias 1° e 16 de março foi de 3.045 ligações e 829 denúncias, entre os dias 17 e 25 de março foram 3.303 ligações e 978 denúncias. Só na cidade de São Paulo, os registros de violência contra a mulher aumentaram 30% no mesmo mês.

No dia 9 de abril, o governo começou a distribuir um auxílio emergencial de R$ 600 a trabalhadores informais, microempreendedores individuais, autônomos e desempregados, formados em sua maioria pelas mulheres. Mulheres que são chefes de família também podem solicitar o auxílio. 

Debora Adão Alves da Silva, 30, moradora do bairro da Brasilândia, na zona norte de São Paulo, é uma das que estão recebendo o benefício . Mãe solteira e desempregada desde agosto de 2019, conta que sua principal fonte de renda para cuidar da filha de apenas um ano é a pensão mensal de R$ 300.

“Esta pandemia, não só para mim, mas para todos de baixa renda, vem causando um grande transtorno. No meu caso, não tem como eu trabalhar para sustentar minha filha, pois ela tem bronquite e está no grupo de risco. Tem dias que não tenho sequer R$ 1 para comprar pão”, conta Debora.

A moça ainda comenta: “Minha filha estava em fase de adaptação na creche, justamente para que eu pudesse voltar a procurar uma nova oportunidade de emprego”.

Com o valor disponibilizado pelo governo em mãos, Debora fala sobre a aplicação da verba: “Pretendo usar esse dinheiro enchendo os armários e comprando as coisas da bebê. As contas ficarão para depois”.