A pandemia causada pelo coronavírus afeta diversos setores da economia. O isolamento social, adotado pela grande maioria dos países para tentar frear a contaminação e aliviar a ocupação de leitos hospitalares, impacta economicamente redes de comércio e entretenimento, que atraem massas da população, como shoppings e estádios de futebol. Um dos maiores prejudicados é a indústria cinematográfica.
Na última semana de março, pela primeira vez na história do Brasil, as salas de cinema ficaram vazias. No mesmo mês, o mercado cinematográfico perdeu cerca de US$ 5 bilhões. De acordo com analistas, o número pode chegar a US$ 15 bilhões, dependendo de quanto a pandemia irá durar. Além disso, a crise foi responsável pela demissão de 120 mil funcionários de audiovisual, somente nos Estados Unidos.
Apesar do grande prejuízo financeiro no mercado global da sétima arte, Mafran Dutra, diretor geral de Produção da Record TV, crê que haverá uma certa recuperação após o fim da quarentena. Ele ressalta a necessidade de uma revisão orçamentária no setor.
“Como o esvaziamento das salas de cinema não tem relação com um desinteresse pelo cinema, mas sim pelo impacto da pandemia, tudo indica que, após a retomada da rotina, as salas de cinema retornarão às suas atividades normalmente. Para tanto, os estúdios já revisaram o calendário de lançamentos. É evidente que este desfalque de faturamento vai exigir uma revisão no orçamento das redes de cinema”, diz.
Para o diretor, os estúdios têm experiência em lidar com lançamentos que não geram o retorno financeiro esperado, o que pode facilitar a adoção de medidas para reduzir os prejuízos.
“Os estúdios estão habituados a lidar com prejuízos em alguns dos seus lançamentos. O fator pandemia trouxe este impacto para os projetos que estavam com lançamentos programados para este semestre. Alguns foram adiados e outros tiverem bilheteria comprometida. O procedimento tem sido revisar os planos de produção e datas de novos lançamentos. Quanto aos lançamentos que não foram adiados, o prejuízo com a baixa bilheteria foi inevitável, resta buscar compensação nas receitas de licenciamentos para as demais plataformas e em outros lançamentos”, analisa.
Os grandes beneficiários do esvaziamento dos cinemas imposto pela pandemia estão sendo os serviços de streaming, que tiveram alta de 9% em março. O crescimento levou a Netflix a ultrapassar a Disney em valor de mercado. De acordo com um levantamento feito pela Nielsen, até o fim do ano, o crescimento poderá ser de 60% entre as plataformas.
A estratégia usada pelos grandes estúdios para contornar a situação está sendo fazer os lançamentos via streaming. O primeiro a adotar essa estratégia foi a Universal, que colocou filmes como Hunt e O Homem Invisível à disposição para serem alugados.
Segundo Mafran Dutra, o crescimento no valor de mercado do streaming já era maior antes mesmo da pandemia, e agora está sendo intensificado pelo coronavírus.
“Os procedimentos de confinamento em massa têm impulsionado o consumo de conteúdo audiovisual em todas as plataformas, não somente dos streamings. Ao mesmo tempo que consumidores que já eram assinantes dos serviços de streaming estão consumindo com mais intensidade, novos potenciais consumidores estão sendo impulsionados a experimentar os serviços de streaming, sendo de fato uma grande oportunidade para fidelizar e agregar assinantes. A indústria já vem se ajustando para estes novos tempos, agregando o streaming como mais uma janela para exibição e faturamento das suas produções ou até mesmo como a primeira delas”, analisa.
Ele complementa: “É possível dizer que a longo prazo, o streaming tem potencial de se tornar a dinâmica de distribuição de obras audiovisuais mais acessível ao grande público. Mas a médio prazo, as demais janelas continuarão competitivas. Desde o lançamento do VHS e do videocassete, que se dizia sobre o futuro incerto do cinema, o que não aconteceu”.
No dia 23 de abril, uma quinta-feira, a Ancine (Agência Nacional do Cinema) aprovou o uso do Fundo Setorial do Audiovisual, visando ajudar as salas de cinema prejudicadas pela crise. Segundo o FilmeB, um dos maiores portais especializados em cinema do país, o montante pode chegar até R$ 400 milhões. A medida é a principal esperança de sobrevivência do mercado cinematográfico brasileiro.