A ciência na alimentação de crianças autistas

Com o crescimento de casos de crianças portadoras do Transtorno do Espectro Autista, muitos cientistas e pesquisadores passaram a estudar os benefícios da alimentação no tratamento
por
Nathalia Teixeira
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16/11/2022 - 12h

Por Nathalia Cristina Teixeira Bezerra

Nos últimos anos, os casos de crianças portadoras do Transtorno do Espectro Autista (TEA) aumentaram significativamente. Dados do Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) mostram que, em 1970 a proporção de crianças autistas era de uma a cada dez mil. Já em 1995 aumentou para uma a cada mil. Em 2018 os números começaram a ficar preocupantes: uma a cada 59 crianças eram portadoras desse transtorno de neurodesevolvimento. Em 2020 foi registrado um para cada 54 e agora, em 2022, uma a cada 44 crianças é autista.

Com a ascensão nos números de crianças neuroatípicas, cientistas do mundo inteiro passaram a estudar o que pode ter ocasionado esse boom do TEA. Apesar das pesquisas ainda estarem em um estágio inicial, profissionais da área se dividem em sugestões do que pode ser a explicação para o fenômeno. Uma das principais hipóteses envolve a alimentação e a quantidade de substâncias pesadas que os seres humanos passaram a ingerir nos últimos anos, como por exemplo os metais. No Brasil, a ingestão de metais pesados como mercúrio, chumbo, cádmio e outros, pode ter sido decorrente do acidente da Vale, que aconteceu em 2014. Outro ponto é a contaminação dos peixes, principalmente nas regiões ribeirinhas do Espírito Santo, que pode estar promovendo problemas de saúde diversos na população brasileira.

Ao relacionar autismo e nutrição há um outro aspecto que também é importante ressaltar. Após o diagnóstico, a alimentação passa a ser um fator determinante no tratamento. Isso porque portadores do TEA, principalmente crianças, possuem intolerância à glúten, lactose e outras restrições alimentares a depender de cada caso. Viviane de Oliveira, estudante de medicina e mãe de Luiz Filipe, um menino autista de cinco anos de idade, fala um pouco melhor sobre como descobriu que a alimentação de seu filho poderia influenciar no TEA: “após quatro meses de vida ele já começou a apresentar reações alergênicas. [...] Ele tomou muitos corticoides, antibióticos e outros remédios, pois sempre estava com rinite alérgica, sempre com problemas pulmonares que liberavam muito muco. Isso já foi um alerta para eu ter uma atenção especial à saúde dele”, relembrou a estudante. “Quando ele teve o diagnóstico de autismo, comecei a pesquisar sobre e descobri uma médica cujo filho é autista e que começou um tratamento de disbiose intestinal, que seria a desinflamação do intestino. Achei super interessante e vi que a primeira coisa que se fazia nesse tratamento era a retirada do glúten, que é um agente inflamatório pro intestino e o leite, que provocava toda essa mucosidade nele”, disse. A partir daí, ela contou que assim que retirou o leite percebeu que seu filho nunca mais teve problemas com mucosidade. Depois, ao retirar o glúten, as crises de dermatite acabaram e inicialmente a ideia era essa de que a retirada desses alimentos iria curar apenas as alergias.

A terapia alimentar é bastante eficiente para o tratamento de autistas. Estudos recentes apontam que, além de reduzir as alergias típicas do TEA, a restrição de certos alimentos para crianças autistas faz com que elas se desenvolvam mais rápido do que outros indivíduos com a mesma condição. No caso de Luiz Filipe de Oliveira, a terapia alimentar fez com que ele desenvolvesse a fala. Como contou Viviane, “com a retirada do glúten e do leite percebi uma grande melhora nele na questão da saúde mesmo. Só que aí eu e os médicos começamos a perceber que o Luiz passou a ter um avanço cognitivo. As terapeutas começaram a elogiar ele, alegando que estava mais atento, fazendo as atividades corretamente e com maior tempo de concentração. Foi aí que me deu mais força de continuar a seguir nesse padrão, juntamente com uma médica ortomolecular que ajudou a fazer uma suplementação específica para ele e com isso eu só tenho visto melhoras”, sendo uma dessas melhorias a questão da fala. Ela contou que, conversando com outras mães, elas afirmaram que ao aderir o tratamento, tiveram ganhos e avanços no tratamento dos filhos. “Não só sobre autismo, conheço mães com filhos com TDAH (Transtorno do déficit de atenção com hiperatividade) e com TOD (Transtorno opositor desafiador), que ajuda muito também a criança a se acalmar, tranquilizar e prestar mais atenção nas atividades”, pontuou.

 

Seletividade alimentar

A nutricionista Patrícia Ferraz explicou que a terapia alimentar auxilia também na questão da seletividade alimentar. A seletividade é uma característica típica de crianças autistas, que vale ressaltar, também possuem transtorno comportamental. Basicamente, ela consiste na rejeição de certos alimentos, como por exemplo legumes e verduras, que pode prejudicar diretamente as vitaminas e os nutrientes necessários para a alimentação da criança.

Uma pesquisa realizada pela Universidade de Medicina de Massachusetts apontou que que crianças com TEA expuseram mais recusa alimentar do que as crianças com desenvolvimento típico, sendo representado cerca de 41%. Além disso, o repertório alimentar dos que participaram do estudo é bastante limitado: apenas 19% dos alimentos apresentados foram aceitos pelo grupo.

Segundo a profissional, “as crianças que não se alimentam corretamente, chegam com queixa de dores e irritações que são decorrentes da má alimentação [...]. Cada caso é único e é preciso analisar o contexto em que o pequeno está inserido, para estudar qual o melhor tipo de alimentação e como superar a seletividade alimentar”, isso porque, como disse a nutricionista, não existe um tipo de alimento específico que seja benéfico para o autista. Cabe ao profissional estudar e entender o que funciona para aquele indivíduo e proporcionar um plano alimentar adequado ao paciente.

 

A eficácia da nutrição é comprovada pela ciência?

Atualmente o tratamento com maior índice de estudos dentro da questão do autismo está baseado em intervenções dietéticas e nutricionais, O objetivo é minimizar qualquer tipo de efeitos deletérios causados pela má metabolização de substâncias alimentares agravadoras do espectro, como por exemplo o glúten.

O que ocorre é que os estudos, por estarem em fase inicial, ainda são bastante controversos e contraditórios. Ainda não há uma ciência que comprove a efetiva  melhora ou não no quadro clínico da criança, por isso a necessidade da avaliação de casos individuais. Tudo que se sabe relacionado à autismo e nutrição é baseado em casos específicos e relatos de pessoas que vivem na pele as melhorias. Apesar de profissionais da saúde acompanharem - e até mesmo indicarem - esse tipo de tratamento, a grande problemática é que os cientistas não conseguiram comprovar a efetividade através das pesquisas.

Em suma, a nutrição dentro do autismo é um tema que vai demandar muito a ciência nos próximos anos. Tanto pelo aumento do número de casos, quanto pela complexidade do assunto, são diversos os fatores que ligam a nutrição e o Transtorno do Espectro Autista, sendo os principais a ingestão de substâncias maléficas para o corpo humano, que é o fator mais provável - de acordo com as pesquisas que saíram até o momento - que causou o aumento repentino de crianças autistas, a prevenção de alergias e mal estar à autistas e a luta contra a seletividade alimentar, aspecto comportamental que é potencializado neste grupo.