Caso Barbosa, o racismo institucionalizado no futebol

Atacado, culpado e criticado, a narrativa racista na construção da memória da final da copa de 50.
por
Leonardo de Sá
|
24/03/2023 - 12h

        Em 1950, o Brasil se preparava para receber o maior evento esportivo do mundo, a Copa do Mundo. Naquela ocasião, o clima era de festa e altas expectativas eram atribuídas à seleção para ser campeã, a possibilidade de uma derrota não era cogitada pela população. Com o decorrer das partidas, as vitórias foram conquistadas. Os jornais já tratavam a seleção brasileira como postulante ao título, como foi o caso do Jornal dos Sports. 

        O jogo Brasil x Uruguai, no dia 16 de junho de 1950, um empate já garantiria a taça para a seleção canarinho. Os brasileiros saíram na frente, mas sofreram o empate. Faltando 11 minutos, a celeste olímpica vira o jogo, ganhando a copa do mundo daquele ano, na casa de seus adversários. A partida teve um peso muito grande para a história do futebol. O recorde de público em um estádio foi atingido pelas 199.854 pessoas. Marca histórica. 

Caso Barbosa, o racismo institucionalizado no futebol
Schiaffino chuta por cima do goleiro Barbosa em 16 de julho de 1950. Foto: BBC Brasil

      Depois da derrota, a população brasileira necessitava de culpados para apontar. Os escolhidos foram três jogadores: Barbosa, Juvenal e Bigode, os únicos negros da equipe. Barbosa foi o mais criticado. Nos anos seguintes, a imprensa, ativamente, colocou sobre o ombro do arqueiro todo o fardo da derrota. Para eles, o gol da virada era culpa do goleiro, mas não por motivos técnicos e táticos, e sim, pela cor.

      A cultura racista internalizada se refletiu no esporte. Barbosa, ídolo do Vasco, eleito um dos melhores goleiros do século XX, enfrentou a massacrante imprensa, que o tratava como um jogador ruim, sem qualidades técnicas e mentais.

     Com o avanço dos estudos sobre o racismo institucionalizado, pesquisadores se dedicaram a estudar o caso da copa de 50. Para tratar de casos atuais no esporte, como o do jogador brasileiro Vinícius Júnior, era necessário revisitar as memórias passadas. O entendimento do caso do ídolo vascaíno, está intimamente ligado às teorias de inferioridade racial, criadas entre o século XIX e XX. Para Antonio Jorge Soares e Bruno Otávio de Lacerda Abrahão em seu artigo “O Que o brasileiro Não Esquece Nem a Tiro É chamado Frango de Barbosa: questões sobre o racismo no futebol brasileiro”. 

     “Os diferentes autores destacam, guardadas as devidas diferenças, que a culpa que recaiu sobre esses jogadores fez renascer as teorias acerca da inferioridade racial brasileira”. As suposições sobre os motivos que levaram a seleção brasileira a perder, colocavam as simbologias da hierarquização cultural no centro. Para Lilian Schwarcz, historiadora da Universidade de São Paulo.

     “Esse preconceito se fundamenta pelas representações hegemônicas construídas pela ciência século XIX que, ao hierarquizar as raças, suspeitava da capacidade racional, moral e psicológica dos negros”. 

      Através dos diversos meios de manifestações culturais, como o esporte, a sociedade foi alertada sobre o racismo estrutural. O futebol está intimamente ligado com as causas sociais e políticas. Segundo Jorge Soares e Lacerda Abrahão. “As idas e vindas sobre um mesmo tema revelam que o racismo ainda é um dilema político, ideológico e cultural da sociedade brasileira.”
  

Caso Barbosa, o racismo institucionalizado no futebol
Goleiro Barbosa, ídolo vascaíno. Foto: Acervo O GLOBO

     O ídolo da seleção, Barbosa, teve sua história injustiçada por uma cultura racista internalizada nos diversos meios da sociedade. Ele teve uma carreira vitoriosa em seu clube, Vasco da Gama, e foi eleito um dos onze melhores goleiros do século XX pela Federação Internacional de História e Estatísticas do Futebol.