A redução de impostos sobre veículos populares causou um efeito positivo em grande parte da população. Dentre todas as medidas de cunho social anunciadas pelo governo Lula, sem sombra de dúvida, foi a que mais gerou discussão e comentários. Até porque, se comparado com o aumento do salário-mínimo de apenas R$ 18 e a redução no preço dos combustíveis, cuja variação não depende exclusivamente do governo, ela parece realmente fazer a diferença na vida das pessoas.
Antes do anúncio, um carro popular custava entre R$ 65 mil e R$ 80 mil, ou seja, entre 49 e 60 salários-mínimos. Poucos brasileiros teriam condições de arcar com isso. Agora, as montadoras já anunciam que o desconto pode chegar a R$ 10 mil e, com a queda nos juros, também prometida pelo governo, o brasileiro, ao que parece, poderá finalmente voltar a ter um carro na garagem.
O diretor do Instituto Locomotiva, Renato Meirelles, explica por que o carro é algo tão importante na vida do brasileiro. “Tem uma história, né? Uma história de que o carro, como a casa própria, foi visto como um patrimônio. Então, durante muito tempo, ter o carro era visto não como um status – do ponto de vista, ‘olha eu sou melhor porque tenho carro’... tinha isso também, mas era menos isso e mais aquela situação de ser algo que eu declaro no Imposto de Renda.”
Renato ainda conta que essa relação patrimonial se desenvolveu para uma relação simbólica-afetiva expressa em atividade prosaicas, como lavar o carro aos domingos de sol ou deixa-lo parado na frente de casa, como uma peça de museu. Porém, todas essas coisas desapareceram após o início dos anos 90, quando os veículos começaram a ficar bem mais caros.
Os motivos são muitos: altos impostos, como o PIS/COFINS, ICMS, IPI; o Custo Brasil (um conjunto de empecilhos burocráticos, fiscais e econômicos do país); a infraestrutura rodoviária – que só tem qualidade próxima das capitais, mas, é precária no vasto interior do país; o acréscimo de inúmeros requisitos regulatórios, como airbags e freios ABS; a falta de investimento em tecnologia e outros fatores macroeconômicos, tais quais a pandemia, a taxa de juros e a desvalorização do real.
A soma de tudo fazia com que um carro popular importado dos EUA custando US$ 20 mil passasse a custar U$ 5 mil no Brasil. Somando isso com a desvalorização do real, os preços chegaram a patamares muito elevados impossibilitando as classes C e D de adquirirem veículos automotores.
O problema é que, de acordo com Renato Meirelles, estas medidas podem não ser suficiente devem favorecer mais a classe média do que o povo. “Se o carro custar R$ 8.000 por mês você parcela em um ano para comprar o seu carro. R$ 8.000 por mês... Sabe quantos brasileiros ganham isso?... Metade dos brasileiros ganham menos do que R$ 2.600 e renda familiar. Metade. Então, a não ser que tenham mudado o conceito do que é ser popular, nós estamos longe de ter um carro popular.”
Ainda é cedo para dizer se o brasileiro comum terá poder de compra para botar um carro novo na garagem, mas é importante lembrar dos reflexos trazidos por medidas como essa. Com o barateamento do carro zero, é muito provável que os carros usados também fiquem mais acessíveis. “É muito provável que as classes baixas ‘ataquem’ esse mercado”, ele conclui.
Fora isso, a possibilidade de se construir ou reativar a indústria automotiva no país, outro ponto inserido no pacote, pode aumentar a oportunidade de empregos em montadoras, distribuidoras e outros mercados relacionados ao carro.
Assim, o brasileiro tem razão em se animar com o barateamento dos veículos e todos os outros benefícios que ele pode trazer. No entanto, é sempre bom esperar a reação do mercado e dos consumidores para saber de fato se o pacote é motivo para comemorar.