O número recorde de 9 milhões de microempreendedores individuais (MEIs) que o Brasil atingiu este ano indica uma forte atração pelo setor, mas não significa que a situação do microempreendedor tenha melhorado no país.
A opinião é do engenheiro e professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP Paulo Feldmann, ex-presidente do Conselho da Pequena Empresa da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo.
“Microempreendedor individual não é empreendedor. A palavra cria essa função, mas na realidade o MEI continua sendo um trabalhador informal”, avalia Feldmann. Para o professor, o conceito de empreendedor no Brasil está vinculado à pessoa que abre uma pequena empresa ou uma microempresa, diferente de boa parte do mundo.
“Empreendedor, em outros países, está vinculado à pessoa que traz uma inovação para o mercado, que cria um produto novo. No Brasil, o responsável pela abertura de uma franquia, por exemplo, é tido como empreendedor, mas, na verdade, é um empresário”, afirma.
Segundo Feldmann, o Brasil é um dos piores países do mundo em proteção e incentivo às pequenas empresas. “Em qualquer país do mundo a pequena empresa tem várias vantagens, como financiamentos especiais e pagamento de impostos reduzidos. O Brasil não tem a mentalidade de apoiar o pequeno empreendedor.”
O professor sustenta que a pequena empresa é uma importante fonte de empregos para o país. De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), os pequenos negócios representam cerca de 99% das empresas do país.
O Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, aponta que 75% das vagas criadas em setembro deste ano foram geradas por micro e pequenas empresas. Feldmann relaciona esse aumento ao crescente número de motoristas e entregadores de aplicativo, mas alerta para as condições precárias de trabalho.
“O número de motoristas de aplicativo dobrou em dois anos. Em sua maioria, são trabalhos precários, sem direito algum. É uma ilusão o sentimento de não haver patrão, de que possuem um horário flexível. A maioria ganha mal e não possui direito nenhum”, completa.
“Em outros países há um direito ou garantia mínima para essas pessoas, mas no Brasil não tem nada”, diz. Em setembro deste ano, o Senado da Califórnia aprovou uma lei que obriga empresas de transporte privado urbano, como a Uber, a reconhecer os motoristas que utilizam a plataforma como seus empregados.
Edson Braga, 58 anos, escolheu trabalhar como motorista no Uber após tentativas frustradas de se realocar no mercado de trabalho de origem. “Troquei de profissão quando o setor imobiliário estagnou. Trabalhava como corretor de imóveis na Praia Grande, litoral paulista. Tentei me realocar na minha antiga profissão, onde supervisionava cartas de crédito, mas não obtive sucesso”, conta Edson, que está há três meses no aplicativo.