A atual pejotização na carreira jornalística

As mudanças no jornalismo têm dado brechas para a naturalização da precarização da profissão
por
Milena Camargo
|
28/11/2023 - 12h

A 'Pejotização' - contratação em modelo PJ - tem sido um problema enfrentado pelos jornalistas. Com a crise do mercado da comunicação muitas empresas da área vem utilizando esse método como alternativa recorrente. Mas apesar de parecer uma alternativa cabível, para muitos isso significa uma negligência significativa para com os direitos dos empregados contratados nessa condição. 

O surgimento da internet e dos smartphones ocasionou em uma transformação drástica do mercado jornalístico. A população que antes se informava majoritariamente pelos conteúdos das grandes marcas do jornalísticas, atualmente se vê à mercê de uma infinidade de fontes e opiniões que estão disponíveis, livremente e gratuitamente, na internet. Apesar da desinformação advinda das ‘Fake News’ serem uma problemática a ser enfrentada, a democratização e a pluralidade das informações na internet impulsionam a grande maioria da população a consumir produtos dos informantes independentes. Segundo o presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo, Thiago Tanji: “Quando começou um crescimento da utilização dos dispositivos móveis aliado às redes sociais, a publicidade, não só do Brasil mas do mundo, migrou. Então hoje, o Google - que faz parte da empresa Alphabet - e o Meta – que é a maior empresa do Facebook – concentram 80% da publicidade Global.”

Homem com óculos de grau

Descrição gerada automaticamente

Figura 1Presidente do Sindicato dos Jornalistas de São Paulo | Thiago Tanji

 

Essa mudança, portanto, estabelece um novo cenário empregatício para jornalistas, muito mais precário e instável. Na terceira semana desse mês a CNN, realizou mais uma sessão de ‘passaralho’, na qual mais de uma dezena de funcionários foram demitidos. Esse tipo de situação tem se tornado cada mais recorrente em decorrência, principalmente, dessa transformação no modelo de comunicação social.

As grandes marcas do jornalismo têm cada vez menos condições de manter seus quadros de funcionários e uma estrutura de trabalho digna e saudável. Diante desse contexto caótico, uma das saídas também utilizadas pelas empresas de comunicação, para além da demissão em massa, é a precarização do trabalho. A jornalista Sueli dos Santos afirmou em entrevista: “Eu não conseguia vagas que fizessem registro em carteira, então eu comecei no mercado de comunicação como PJ.”

A ‘Pejotização’ nada mais é do que a informalização da contratação em benefício do empregador e em detrimento do funcionário. Ao invés de contratar o jornalista - ou qualquer outro funcionário - em modelo CLT, como deve ser feito de acordo com as leis trabalhistas, as empresas vêm naturalizando cada vez mais a contratação via PJ (Pessoa Jurídica). As contratações PJ no Brasil vêm crescendo em larga escala e batendo recordes. Segundo dados do IBGE, somente neste ano, já são as contratações PJ no Brasil vêm crescendo em larga escala e batendo recordes. Segundo dados do IBGE, somente neste ano, já são milhões de trabalhadores inseridos nesta condição de trabalho. Segue abaixo o gráfico de um estudo da fundação Getúlio Vargas sobre com um comparativo em relação a ascensão da contração em PJ em detrimento da contratação em CLT.

                                                 Pejotização: uma análise a partir de dados da PNADC | Blog do IBRE

No modelo PJ o contratado não tem direitos, tais quais: décimo terceiro salário, férias remuneradas, seguro-desemprego, licença maternidade, contribuição junto ao INSS, indenização etc., como teria na contratação CLT. Muitas vezes para encobrir esses benefícios, o empregador acaba oferecendo um valor de salário um pouco mais alto do que o que se oferece no mercado como um todo, mas ele ainda sai em vantagem já que os direitos trabalhistas, ainda sim, são mais custosos. Entretanto, apesar de em alguns casos o empregador oferecer salários altos, essa não é uma regra. E muitas vezes, além da contratação ser informal, os salários oferecidos são equivalentes ou até mais baixos que os oferecidos pelo mercado.

Outro ponto relevante é que quando apresentadas aos candidatos, as vagas PJ vestem uma roupagem de ‘prestação de serviços’ onde o contratado seria um terceirizado da empresa. Entretanto, depois de contratado o empregador acaba exigindo uma habitualidade do empregado onde dele deve satisfações constantes como: pontualidade, subordinação e entregas de atividades regulares e cotidianas. É importante estar atento pois o prestador de serviços faz entregas pontuais e não lhe pode ser exigida uma habitualidade diária como na contratação CLT. “A questão do PJ não é de agora, é de muito tempo. A gente tem que entender que a relação de trabalho mudou, mas infelizmente com o trabalhador tendo desvantagem. Porque não é a contratação no modelo PJ que incomoda, o que de fato incomoda é ser contratado como PJ e ter obrigações de CLT.”, explica Sueli.

 

A mudança do mercado jornalístico apesar de ter sua relevância para o entendimento de todo o contexto empregatício, não deve ser uma justificativa da precarização por parte das empresas jornalísticas. É importante um olhar crítico sobre os novos rumos do mercado para tomadas de decisões mais conscientes, mas o reconhecimento e a luta pelos direitos trabalhistas devem nortear as pautas e decisões de todos os envolvidos na nova estruturação do mercado jornalístico. Thiago Tanji, relembra, portanto, a importância da luta coletiva em prol da defesa dos direitos trabalhistas: “Enquanto a legislação não mudar e continuar mantendo a impunidade às empresas que cometem essa fraude, nós temos que se agrupar e conversar sobre como conseguimos nos unir nessa questão.”