A reinauguração do Museu do Futebol de São Paulo traz diversas mudanças incluídas no acervo atual. Localizado no Estádio do Pacaembu, após oito meses de reforma, o local reabriu suas portas no dia (08/07), com uma nova proposta de apresentar a história do esporte. A inclusão feminina no conjunto do museu foi o grande diferencial, informações que antes não tinham visibilidade, agora recebem reconhecimento vindo das coleções futebolísticas.
Renata Beltrão, jornalista e mestra em Museologia, acompanha o tour com os visitantes e explica as mudanças ocorridas ao longo do tempo, dando ênfase à inserção da figura feminina. Os novos materiais incluídos no museu, foram frutos de pesquisas decorrentes de quinze anos para cá. Mesmo o esporte sendo praticado por mulheres desde os anos 20, a demanda por informações históricas se deu a pouco tempo atrás.
A visita conta com quatro instalações inéditas que falam apenas sobre o futebol feminino no período em que ele foi proibido no Brasil. Na época, em 1941, o presidente Getúlio Vargas assinou um decreto-lei que impedia as mulheres de praticarem esportes que não fossem adequados “à sua natureza”. O país estava prestes a enfrentar um período de ditadura militar, no qual a censura era algo comum, o que não foi diferente com as atletas mulheres.
Os primeiros registros de futebol feminino no Brasil são dos anos 20 e 30, eram divulgados por jornais locais de maneira sutil. O esporte não era visto como uma partida, mas sim como uma performance ou show, já que o circo era o local das “apresentações”. Ao longo desses anos o futebol entre mulheres não era praticado em clubes ou ligas, mas sim nas periferias e, mesmo não sendo impedida ainda, a modalidade era ligada apenas aos homens por ser considerada violenta.
A proibição do esporte veio em 1941, após um jogo ocorrido no Estádio do Pacaembu entre mulheres no ano anterior. O intuito era dar visibilidade e incentivar a figura feminina, mas o resultado foi extremamente contrário. Uma revolta foi gerada por grande parte da sociedade, e as notícias divulgadas serviram de combustível para o desagrado da opinião pública e das autoridades.
Através de um processo de regulamentação do esporte no Brasil, criou-se o CND (Conselho Nacional De Desporto), foi quando as autoridades decidiram proibir a prática feminina. O decreto-lei (3199, art 54) dizia que as mulheres não poderiam praticar esportes que não fossem adequados à sua natureza. A jornalista Renata Beltrão comenta: “As mulheres brasileiras continuaram jogando bola mesmo com risco de serem presas, o que de fato acontecia”
Em 1965 o decreto foi publicado novamente com mais detalhes, inibindo de vez a participação feminina, o que infelizmente nos proporciona poucos registros da época, que se passavam na ditadura militar. As mulheres jogavam de forma clandestina com medo de serem pegas. Apenas em 1979 a proibição teve seu fim, 38 anos depois. Porém, as coisas não melhoraram de uma hora para outra como esperado, o esporte ainda não recebia ajuda de clubes e federações, além de ser discriminado.
A modalidade foi regulamentada de fato somente em 1983, as competições, os calendários, a utilização de estádios, a inserção nos clubes, todos esses detalhes que antes eram liberados apenas para os homens, começaram a fazer parte do cenário feminino também. A primeira Copa FIFA aconteceu em 1991, ainda com muito amadorismo, a CBF assumiu de forma oficial o time. A seleção também estreou nas olimpíadas no ano de 1996, marcando de vez uma nova era.
O futebol feminino passou por diversos problemas ao longo dos anos, um processo histórico que deixa marcas até hoje. Infelizmente a diferença de tratamento com o esporte das mulheres continua nítida, a falta de investimentos e de apoio permanece, mesmo que de forma mais “escondida”, ainda é necessária muita luta para igualar o patamar de benefícios e oportunidades masculinas no esporte.
Em entrevista à BBC News Brasil, Natália Pessanha, pesquisadora da Universidade Federal Fluminense (UFF), afirma que: “Em 2022, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) destinou aproximadamente R$ 200 milhões à seleção masculina principal. Outros R$ 70 milhões foram divididos entre o time feminino e sete seleções de base, segundo dados divulgados pelo próprio órgão.”
Marta, a rainha do futebol pode ser usada como grande exemplo, a atleta que recebeu o prêmio de melhor jogadora do mundo seis vezes e ganhou três medalhas olímpicas representando a equipe brasileira, nunca recebeu nem metade do salário de Neymar, também jogador da seleção de futebol brasileira.