Por Rodolfo Dias (texto) e Ian Valente (audiovisual)
Os melhores dias para visitar o Louvre são na segunda e na quinta, como ele fecha às terças, na quarta-feira é lotado, assim como na sexta e fim de semana, o museu mais famoso do mundo recebe cerca de 190 mil visitantes por semana, para aproveitar suas 35.000 exposições. Na minha primeira visita ao site oficial do “forte” Francês, a primeira imagem que me deparo é com a Mona Lisa, a inestimável pintura de Leonardo da Vinci com os dizeres “Welcome to the Louvre”. A arte mais famosa do mundo marca o Renascimento, as técnicas usadas com a genialidade de seu criador a tornam única, e a estranheza de suas histórias que passam por roubos, tentativas de destruição e por ser pintada em madeira são o atrativo para a maioria dos visitantes do museu, que lotam a Salle des États o maior salão do local.
Continuando o tour pelo site, saindo do que seria os pontos altos do local, rolando um pouco o mouse para baixo, me deparo com a aba Louvre at home, como uma visita ao espaço sem precisar estar na frança, de casa é possível conhecer as lendárias paredes do museu. Entre as atrações possíveis de “visitar” em casa está a tal da Mona Lisa, porém em realidade virtual, um jeito de conhecer a mística criação sem precisar visitar a Europa, pegar horas de fila e enxergar por trás de um vidro espesso a prova de balas, a bela Mona Lisa.
A constante mudança na forma de fazer arte impacta diretamente na forma de vendê-la, para uma instituição como o Louvre a renovação de algo criado a 500 anos atrás é necessária, apesar do alto número de visitas feitas à obra, e seu valor em dinheiro inestimável, são muitos os motivos que levam o museu a adotar uma estratégia de interação digital, visto como um paradigma a artistas que trabalham com a tecnologia contemporânea, a utilização da internet é capaz de aproximar as pessoas da arte - É esse lugar que eu tento desvendar com a arte, a gente não pode negar que ela ajuda o desenvolvimento - Comenta Fernando Velázquez, expoente artista visual de São Paulo.
Velázquez além de artista é curador e professor, nascido em Montevidéu (Uruguai) atualmente reside e trabalha em São Paulo, suas principais expressões artísticas vão de encontro com o desenvolvimento tecnológico presente na sociedade contemporânea. Multimidiático, suas obras misturam os aspectos que ligam a arte à tecnologia. Com objetos interativos, elementos audiovisuais e a sustentação do algoritmo nas lógicas de programação, a arte do uruguaio é responsável por reunir a capacidade de percepção intrínseca ao corpo humano com os meios tecnológicos, misturando a arte com fatores científicos, filosóficos e antropológicos.
O artista afirma que a criação de artes relacionadas com a tecnologia é algo intrínseco na sociedade, que a sua evolução depende da relação dos artistas com as diferentes formas de inovar o seu trabalho com tais tecnologias. Considerar a arte como um complexo de ‘’coisas’’ conclui Velázquez, para ele é impossível defini la, já que caso ela seja, o seu caráter subjetivo, o de cada indivíduo interpretar de uma determinada forma, morrerá, impedindo a formação de um campo humano que trabalha justamente com imaginário.
A tecnologia constantemente associada como sinônimo de progresso, ressaltando a sua capacidade de compartilhar conhecimentos de forma instantânea e por permitir a interação entre vários setores, países, culturas e opiniões de forma global, pode apresentar perigos existentes nos meios tecnológicos, sobretudo com o desenvolvimento das Inteligências Artificiais (IA’s), capazes de reproduzirem algoritmicamente características até então monopolizadas pelos seres humanos, a mesma tecnologia capaz de auxiliar o desenvolvimento sociocultural é capaz também de cercear o fator humano das fontes relacionados ao desenvolvimento cultural.
Por serem criadas pelos humanos, esses meios estão, também, propícios a repetir nossos próprios erros e preconceitos. Como o seu desenvolvimento ocorreu de forma mais acelerada nos países colonizadores, elas, consequentemente, foram infectadas com a perspectiva de que o mundo está à mercê do homem branco europeu ocidental que segue tendo o protagonismo da humanidade. Ou seja, as Inteligências Artificiais podem ter alta capacidade de reproduzir o racismo, a homofobia, o machismo, entre outras mazelas, o assunto gera polêmica, mas para Velazquez a construção disso carrega responsabilidades, como indivíduos consumidores destas tecnologias intrínsecas na sociedade, é necessário pensar e analisar o viés desta inteligência.
Um terreno vasto e ainda muito inexplorado que depende de caminhos criativos para, por enquanto, dominar uma arte sem preconceitos. Em sua exposição Rituais da Complexidade, Velázquez consegue expressar artisticamente uma dualidade entre o passado e o futuro, o humano e tecnológico. Nela, imagens são criadas a partir de experiências que envolvem o uso das IA’s obtidas a partir de algoritmos manipulados pelo autor que aprendem e geram novas figuras através do hibridismo, resultado do encontro de estéticas diferentes, como a grega com a africana que, posteriormente, foram impressas por impressoras 3D e expostas. Refletindo sobre a Pós-modernidade, cria-se uma manifestação crítica a respeito de um passado que sequer existiu, bem como de um futuro que mistura arte e tecnologia de outras fontes de conhecimento que fujam de qualquer perspectiva eurocentrista.
Em um panorama, as manifestações artísticas estão sempre ligadas ao objetivo imagético de seu autor, as tecnologias que disparam na atualidade e dominarão potencialmente o futuro destas demonstrações culturais, acompanham as motivações de seus criadores, oligopólios massivos dominam o que há de mais novo no quesito tecnológico, empresas como Google, Microsoft e Meta são alguns nomes consideradas “Big Techs” que detém as melhores e mais novas ferramentas para impulsionar os avanços como lhes convém. Fernando Velázquez conclui falando sobre o papel dos artistas independentes que, diferentemente do Louvre, devem usar as tecnologias para “quebrar” sua lógica programada, criar processos que fujam a todo custo de uma ideia hegemônica e impositiva.