Após 16 anos, ‘Linha Direta’ retorna às telas

Pioneiro do ‘True Crime’, programa da Globo está de volta em meio à ascensão do gênero no país
por
Lais Romagnoli
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28/06/2023 - 12h


Tendo tido seu auge no fim dos anos 90 e início dos anos 2000, quando foi líder de audiência, o programa “Linha Direta” voltou a ser exibido no dia 4 de maio pela TV Globo. Apresentado originalmente pelo jornalista Domingos Meirelles, o programa abordava casos criminais e sobrenaturais com um tom sombrio que permanece até hoje no imaginário dos telespectadores.


Inspirado em atrações americanas, como “Yesterday” e “The Unsolved Mysteries”, Linha Direta se tornou um sucesso ao misturar a realidade com a encenação de fatos. Por mais de uma década, prendeu a atenção do público com uma linguagem clara e elementos de suspense.

Comandada pelo jornalista Pedro Bial, a nova versão propõe exibir ocorrências policiais que repercutiram nacionalmente, retratando os acontecimentos com simulações e entrevistas. Além de abordar o desfecho judicial dos casos, no fim de cada episódio, imagens de foragidos pela justiça serão divulgadas.

No dia em que Eloá completaria 30 anos, o programa de estreia exibiu a tragédia que resultou na morte da jovem. O sequestro, que durou aproximadamente 100 horas, é um dos exemplos mais conhecidos de sensacionalismo midiático, um dos principais pontos abordados por Bial.

Além da reconstituição, reportagens da época e entrevistas com especialistas são fundamentais para o entendimento do impacto da imprensa sobre o caso. Ligações de apresentadores para o sequestrador, atuando como negociadores sem o mínimo preparo, e a transmissão do cárcere em tempo real são apresentados como fatores contribuintes para o trágico desfecho de um dos casos de feminicídio mais famosos do país.

Em entrevista à revista CartaCapital, a cineasta e pesquisadora Lívia Perez, diretora do documentário “Quem matou Eloá” (2015), opinou sobre a cobertura jornalística do caso: “Houve uma postura muito machista por parte da imprensa, que enalteceu a personalidade do criminoso e romantizou o tipo de crime”. A diretora afirmou que esse comportamento midiático colabora nos altos índices de casos de violência contra a mulher.

O segundo episódio de “Linha Direta” exibiu um caso que chocou a Paraíba, a invasão a uma festa de aniversário que resultou no estupro coletivo de cinco mulheres e no assassinato de duas delas. Após as investigações, concluiu-se que tudo havia sido planejado pelo aniversariante e seu irmão, com o intuito de abusar sexualmente das convidadas da festa.

Buscando por culpados, familiares das duas vítimas fatais seguiram a crença popular e colocaram uma moeda debaixo da língua dos cadáveres para que os corpos sangrassem se o assassino estivesse por perto. assim feito, com a presença dos próprios no velório, os corpos de Izabella e Michele sangraram. O momento, retratado no “Linha Direta”, repercutiu nas redes sociais.

Uma das entrevistadas foi a irmã de Izabella, Ismênia Monteiro, que mesmo receosa decidiu se manifestar. "Eu não queria estar aqui, fazendo isso. Eu sei que de alguma forma expõe demais. Expõe a minha imagem. Me deixa de certa forma insegura. Mas neste momento eu não posso silenciar pelo meu sangue que foi derramado.”

O terceiro episódio contou a história de luta de um pai por justiça: o caso Henry, que impactou o país pela frieza da mãe e do padrasto do menino de apenas 4 anos. Ao ser entrevistado por Bial, o pai de Henry, Leniel, narrou detalhadamente o fim de semana fatídico e contou como tem sido sua vida após a tragédia. Lenielfundou a Associação Henry Borel, instituição com foco na proteção de crianças e adolescentes no Rio de Janeiro.

Simulando situações de violência à criança, o programa expôs a omissão da mãe, Monique, e a violência do padrasto, Jairinho. Além da troca de mensagens entre Monique e a babá de Henry, vídeos antigos mostraram lesões supostamente causadas pelo padrasto, em episódios anteriores à tragédia.

Com o processo ainda em curso, a Justiça do Rio censurou o episódio, preocupada com a exibição em canal aberto e a reação do júri popular. Entretanto, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), derrubou a medida e o “Linha Direta” exibiu a reconstituição daquela noite. Ainda enfatizou a luta do pai do menino, responsável pela aprovação da Lei Henry Borel, que tornou o homicídio de menores de 14 anos um crime hediondo.