85 anos de Jorge Ben Jor

Relembre os momentos marcantes da carreira e vida de um dos maiores compositores brasileiros
por
Catarina Pace
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22/03/2024 - 12h

Jorge Duílio Lima Meneses nasceu em Madureira, no Rio de Janeiro, em 22 de março de 1939. Filho de Augusto Menezes e de Silvia Saint Ben Lima, Jorge queria ser jogador de futebol e chegou a integrar o time infanto-juvenil do Flamengo, mas acabou seguindo o caminho da música, que sempre esteve presente em sua vida. Aos 13 anos ganhou seu primeiro instrumento, um pandeiro, o que o levou a cantar no coro da igreja e a participar como pandeirista nos desfiles de carnaval.

Influenciado por João Gilberto e astros do Rock como Little Richard, o compositor viveu o período da bossa nova, marcado por grandes personalidades e composições da música brasileira. Mesmo com grandes inspirações da época, Jorge Ben, como veio a ser chamado desde o início da carreira, sempre buscou inovar em um ritmo que viria a se tornar uma marca única da sua música. 

Autora: Catarina Pace
Jorge Ben Jor. Imagem: Reprodução/MPB Publicações

Mas Que Nada

Tudo começou em 1963, no Beco das Garrafas, o refúgio das apresentações da Bossa Nova. Jorge subiu ao palco e soltou a voz ao som de seu primeiro grande sucesso, “Mas Que Nada”, sua primeira composição, que já havia sido gravada em 1962 para seu álbum de estreia, “Samba Esquema Novo”. 

Conhecida internacionalmente, a canção, que não se encaixava em nenhum estilo musical da época, só ganhou notoriedade ao ser gravada pelo pianista e compositor brasileiro, Sérgio Mendes. Não era Samba, muito menos Bossa Nova. Assim surgia seu estilo único, uma união de rock and roll, samba, samba rock, bossa nova, jazz, maracatu, funk, ska e até mesmo hip hop. O sambalanço também é um estilo característico nas músicas de Jorge.

Mais tarde, ela se tornou uma das músicas da língua portuguesa mais executadas nos Estados Unidos, assim como “Garota de Ipanema”, foi gravada por várias personalidades importantes da música mundial, como Ella Fitzgerald, Coldplay, Red Hot Chilli Peppers, Black Eyed Peas e Dizzy Gillespie. 

Mas Que Nada!

Vídeo: Reprodução/Youtube/Jorge Ben Jor

Rei do Sambalanço 

Na década de 70, a carreira de Jorge Ben Jor decolou no Brasil. Ele lançou os hits "Cadê Tereza?", "País Tropical", "Que Pena" e "Que Maravilha". Na mesma época venceu o Festival Internacional da Canção, da TV Globo, com "Fio Maravilha", interpretado por Maria Alcina. 

A canção conta a história de um gol feito em 15 de janeiro de 1972, por João Batista de Sales, o Fio Maravilha, jogador do Flamengo, que se tornou um ícone no mundo do futebol pelo gol de placa no Maracanã contra o Benfica. Na época, Zagallo, treinador do Flamengo, foi pressionado pela torcida para a entrada de João ao campo. Na primeira jogada driblou o goleiro e já dentro da área, aos 33 minutos do segundo tempo, fez seu gol. Assistindo ao espetáculo da arquibancada, Jorge Ben Jor imortalizou a jogada na canção. Mas, o jogador chegou a processar o cantor por uso indevido de seu apelido, o que fez com que a música fosse renomeada de “Filho Maravilha”. Mesmo com uma história um tanto quanto curiosa, ainda é um dos fenômenos do carnaval no país.

Filho Maravilha 

Vídeo: Reprodução/Youtube/Jorge Ben Jor

Ainda na década de 1970, Jorge Ben lançou os álbuns “A Tábua de Esmeralda (1974)”, “Solta o Pavão (1975)” e “África Brasil (1976)”, considerados experimentais e esotéricos, ou seja com letras enigmáticas e incomuns, principalmente para a época. Mesmo sem sucesso comercial na época, principalmente por serem muito diferentes do que  a música costumava entregar, hoje, os álbuns são considerados clássicos da música brasileira. 

Em África Brasil, um remake da famosa “Taj Mahal” obteve muito sucesso e foi vítima de plágio pelo cantor Rod Stewart em 1979. Jorge percebeu a semelhança nas notas do refrão com a música “Da Ya Think I’m Sexy” e processou o cantor britânico por plágio, que doou os lucros obtidos com a veiculação da faixa à UNICEF. 

Em sua autobiografia, “Rod. The Autobiography”, o cantor e compositor inglês  assume que cometeu o plágio e que conheceu a canção quando passou o carnaval no Brasil em 1978. “Certo. Tive que dar a mão à palmatória. Mas claro que não cheguei assim no estúdio e falei: ‘Vamos usar a melodia de Taj Mahal no refrão e azar. O compositor mora no Brasil, então nunca descobrirá’. Só que eu tinha ido pro carnaval do Rio, em 1978, com Elton John e Freddie Mercury. E lá duas coisas significativas aconteceram. Me apaixonei por uma estrela de cinema brasileira lésbica, que não deixava me aproximar dela. Depois, 'Taj Mahal', de Ben Jor tocava o tempo inteiro, foi relançada naquele ano, e obviamente a melodia alojou-se na minha memória, e emergiu quando comecei a fazer a música. Puro e simples plágio inconsciente. Abri mão dos royalties, me perguntando se 'Da Ya Think I’m Sexy?' era meio amaldiçoada.”

Este mesmo álbum foi um marco da carreira de Jorge. A partir dele, o compositor trocou seu violão acústico pela guitarra elétrica e inovou seu estilo musical. Com uma mistura de tons e sonoridades, a união de sons afro-brasileiros, afro-latinos, da música negra norte-americana e da própria África, ele reinventou a música brasileira e adicionou aos temas que costuma abordar - amor, raça, futebol e a própria alquimia, - um brilho a mais.

O livro “África Brasil: um dia Jorge Ben voou para toda a gente ver”, da jornalista Kamille Viola, analisa perfeitamente a trajetória de uma das maiores lendas vivas da música brasileira e como ele se tornou um alquimista do mundo da música. Um dos grandes entrevistados por ela foi Mano Brown, do grupo Racionais MC's. Fã assumido, ele resume em poucas, mas importantes palavras, a grandiosidade de Jorge Ben.

"É um cara que, igual ao James Brown, Marvin Gaye, e esses artistas muito grandes com uma obra muito grande, de tempos em tempos eles vêm em você. A música volta. Eu ouvi o Jorge Ben em várias épocas da minha vida, várias épocas da carreira dele. Eu lembro de muitas fases. [...] Nas rodas de samba, a gente cantava Jorge Ben. Quem soubesse cantar Jorge Ben num ritmo de samba ia bem.”

Um aspecto importante na discografia de Jorge Ben Jor é a exaltação da cultura negra. Autodeclarado negro em muitas músicas, seu primeiro álbum foi lançado em um período que esse orgulho racial não era bem visto, 1963, um ano antes da ditadura militar ser instaurada no Brasil. Ainda assim, o cantor construiu uma identidade negra muito forte em suas criações e também pôde homenagear figuras negras importantes do país, como Xica da Silva e Zumbi dos Palmares, em canções que levam seus nomes. 

Hoje, o Zé Pretinho segue sendo uma das lendas vivas do país, deixando um legado importante na música brasileira. Com 85 anos, ele inspirou e foi inspirado a construir estilos musicais diversos e plurais. Como um dos maiores nomes da música, não só brasileira, mas mundial, Jorge Ben vive e transmite tudo o que construiu durante sua extensa e incrível discografia, sendo símbolo de resistência e talento.

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