42ª Semana de JO debate o papel do repórter na cobertura política

“Estou aprendendo a ser jornalista de novo” disse a jornalista Marina Dias
por
Isabela Lago Miranda, Maria Luiza da Costa Marinho, Ramon Henrique de Paschoa Baratella e Tabitha Ramalho
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22/09/2020 - 12h

As jornalistas Marina Dias e Carolina Trevisan foram recebidas por um sorridente mediador da segunda mesa da 42ª Semana de Jornalismo da PUC.  Com saudosismo, professor José Arbex dava boas vindas online a ex-alunas do curso.

Mas, desta vez, a aula era delas; Uma crise dentro da crise: a cobertura política na pandemia  foi o tema debatido pela correspondente da Folha de São Paulo e pela colunista do UOL. Ao refletir sobre o trabalho do jornalista de política nestes tempos modernos, Marina disse que estava aprendendo a ser jornalista de novo: "A pandemia reformulou nossa forma de fazer jornalismo”, afirmou, ao destacar as  intermináveis videoconferências entre repórter e fonte.

Sem a possibilidade de entrevistas presenciais devido a pandemia, Carol Trevisan fala da importância de estabelecer conexões, e o pacto de confiança do repórter com as fontes: “A gente quer conseguir explicar um país desse tamanho”, ressaltou. A colunista do UOL enfatizou a importância de nos cercarmos de pessoas confiáveis.

O ponto de unanimidade entre a plateia online e as convidadas foi, além do jornalismo político, também uma certa "delicadeza" de uma cobertura jornalística de política em pleno isolamento social.

As convidadas enfatizaram o quanto a cobertura jornalística tem perdido e ganhado ao mesmo tempo, adaptando-se em metamorfose. “Queria trazer isso pra mesa , esse formato novo que o temos de fazer jornalismo”, pondera Marina Dias, entusiasmada com a presença de mais de 200 participantes na mesa.
 

A leveza e o bate-papo inundaram a segunda mesa da Semana de Jornalismo na PUC-SP, que abriu espaço para uma descontração entre professores, e comentários que transcendem gerações ligando todos a uma única antena: o dever de mostrar a verdade e a paixão por contar histórias reais. Arbex, de forma muito bem humorada, conduziu toda a situação e ainda brincou com as mazelas que tem passado durante as aulas online: “Não sei se eu que sou dinossauro ou realmente falta esse contato”. As jornalistas lamentaram a ausência de contato com o público, os cafés com as fontes, o ser e estar nas ruas com o povo e toda a bandeira de direitos humanos que faz parte da narrativa de todo bom jornalista. 

Print da mesa com convidadas, organizadoras e professores
Marina relatando sua experiência em Washington

Marina comentou sobre sua cobertura durante as manifestações do Black Lives Matter e argumentou: “Eu me emocionei com aquilo, meu pai fala uma frase que diz: enquanto você se emociona, está sendo um bom jornalista. Então eu permiti me emocionar”; o mito da imparcialidade jornalística foi bem discutido durante a mesa, e as convidadas, de forma unânime,  destacaram a importância da cautela e da segurança do repórter: “Você tem medo? eu tenho medo e acho que o medo me protege”, enfatizou Carolina Trevisan

A estudante Lígia Saicali pergunta sobre o fato de  o jornalista se desvincular das relações partidárias ou ideológicas para uma boa reportagem.

Marina responde: “Direitos humanos não é lado político, é humanidade”, e comenta sobre projetos e reportagens com os quais se manteve muito envolvida por tratar-se do sentimento do entrevistado.  

A jornalista Maria Carolina Trevisan relembra  o recente caso da menina de dez anos que realizou o aborto legalmente: “Esse é um caso que chama muito a atenção porque ele junta a política em relação com a violação de direitos humanos da menina”

Carolina destaca como as informações chegaram até ela. “Conforme eu ia apurando, descobri que quem tinha publicado o nome e o local tinha sido a Sara Winter, que foi funcionária do ministério, não só ela mas também outras pessoas que tentaram provocar tumultos antidemocráticos no governo como por exemplo aquele cara que tentou jogar fogos de artifício na frente do Supremo Tribunal Federal”.

Ela termina dizendo que o Ministério dos Direitos Humanos refutou a reportagem: "É uma prática do governo Bolsonaro ameaçar jornalistas como a gente tem visto desde o começo (...) também porque o presidente tem uma preferência por fazer essas ameaças a jornalistas mulheres, isso não é à toa”.

Jornalista Carolina Trevisan
Carolina Trevisan comentando questões políticas do país

 

Questionada sobre a forma de realizar jornalismo político, Marina Dias comenta: “Eu acho que a gente precisa ser objetivo, precisa ter distanciamento, mas a gente não precisa se despir de quem a gente é para fazer jornalismo”, relacionando com a cobertura de direitos humanos realizada por sua colega de mesa. 

Como correspondente nos Estados Unidos, Marina narra a dificuldade de abordar entrevistados na rua. Mesmo com máscara e distanciamento do entrevistado, apoiadores de Donald Trump insistem para que a jornalista retire sua máscara e a cumprimente com um aperto de mãos.

“Por mais que às vezes eles nem conheçam o jornal brasileiro, eles falam ‘você é jornalista mesmo?’”.

Ela termina afirmando que considera o maior risco de um jornalista estadunidense no momento manter sua saúde e segurança durante a pandemia, principalmente em situações como a descrita.

“Como correspondente internacional, eu não sou um alvo do governo Bolsonaro como a Folha de São Paulo é”.

Carolina Trevisan, por outro lado, comenta: “Para cobrir e se proteger em um governo autoritário é preciso estudar muito, você não pode chegar lá para fazer uma entrevista com ninguém desse governo, ou nesse momento político do Brasil, sem estar muito bem preparada (...), você pode cair numa armadilha”, que considera essencial para que não perca credibilidade, não seja atacada. 

Ao ser questionada a respeito da cobertura jornalística sobre o racismo no Brasil e nos Estados Unidos, Carolina Trevisan lembra de uma frase de Carlos Moore, escritor cubano que já entrevistou: “O racismo é plástico, se adapta aos momentos históricos”. Aborda que o Brasil, como o país cuja escravidão durou mais tempo, possui uma dívida histórica e necessidade de reparação, e a função do jornalismo seria reconhecer esse racismo na forma em que se apresenta na sociedade, através da escuta e da humildade.

Quando Marina Dias conta sobre o momento em que Trump dispersou a manifestação pacífica em frente à Casa  Branca com bombas, ela relembra a fala de seu colega argentino: “Você tem mais medo da polícia daqui ou da polícia do Alckmin de São Paulo?”, o que trouxe um choque para os participantes da mesa em relação a tamanha violência policial: “Eu cobri as eleições de 2013 e me vi ter esse medo novamente”.

As eleições americanas serão agora em 3 de novembro e os atos de Donald Trump  são de acordo com seu nível de popularidade nos estados, “eu falo para os meus amigos e colegas de redação que eu vim do futuro, porque tudo que o Trump fala o Bolsonaro faz” Marina brinca no final.

O encerramento do primeiro dia da 42ª Semana de Jornalismo consta com a fala de Arbex à Carolina Trevisan “queria ter tido você como aluna”, além de relembrar da participação efetiva da sua ex aluna Marina Dias no jornal ContraPonto.

 

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